Crítica | Festival

O Cerco

(O Cerco, BRA, 2020)

  • Gênero: Drama
  • Direção: Aurélio Aragão, Gustavo Bragança, Rafael Spínola
  • Roteiro: Aurélio Aragão, Gustavo Bragança, Rafael Spínola
  • Elenco: Liliane Rovaris, Geovanna Lopes, Marco Lopes, Matheus Lopes, Alberto Moura, Breno Nina, Aurélio Aragão, Gustavo Bragança, Rafael Spínola
  • Duração: 87 minutos
  • Nota:

Produção carioca que homenageia Ruy Guerra e Lucia Murat ao evocar traumas de um Brasil que não lambe suas feridas e a fortaleza emocional que representam as artes cênicas como lugar de cura, ‘O Cerco’ trata de fantasmas visíveis e invisíveis na vida de uma diretora teatral.

A voz de Ana (Liliane Rovaris) ecoa pelos espaços da casa assombrosa, pelo timbre de Stella Rabello. A história se passa naquele prédio familiar, no apartamento que fica no último andar onde ela reside e no terraço, que meio que evoca as memórias mais antigas dela naquele lugar – o subsolo da infância. 

Três são os diretores de ‘O Cerco’ (Rafael Spínola, Aurélio Aragão e Gustavo Bragança) e três são as crianças solares, ainda que na aparência sejam acinzentadas, na fotografia em preto & branco do filme.

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Isolada com a filha pequena no apartamento, Ana pensa em si quanto criança e com os dois amigos, estirados na lajota fria do terraço. Os fantasmas do presente também estão rondando o lugar, ressurgindo como ex-namorados. O ex-marido, pai da menina, pontua os devaneios de Ana e a puxa para o momento atual.

“Um morto pela ditadura, celebrado na volta dos exilados derrotados…. A volta dos que nunca partiram, indo e voltando ao passado. Hoje e em 1973”.

Evocações bergmanianas também se fazem perceber em ‘O Cerco’, seja por citações diretas como a música de Sonata de Outono, seja o fluxo da memória como conduíte da narrativa, aspecto marcante em Morangos Silvestres. E para além, o próprio universo do teatro, um mundo de fuga, de imaginação aflorada, de sonhos e pesadelos materializados. A arte e a sobrevivência como chamas que se mantém acesas.

Tenho ares de serpente

Mas em casos de amor

Sou pequena, sou carente

Sou mais frágil que uma flor

Ana resiste as dores que a querem mergulhar no abismo da depressão, ao medo do desconhecido e do muito conhecido. Em determinada sequência, a personagem fala ao telefone como que transtornada, falando ao ex-marido que a casa sofreu uma invasão e ela está sendo constantemente vigiada pois recebeu um video que mostra ela e a filha no apartamento. Na lembrança, voltam os meses passados no DOI-CODI. E a sensação de que “Eles venceram, pelo menos em mim.” Essa não a abandona.

Um grande momento:

Brincando no terraço


[24ª Mostra de Cinema de Tiradentes]

Lorenna Montenegro

Lorenna Montenegro é crítica de cinema, roteirista, jornalista cultural e produtora de conteúdo. É uma Elvira, o Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema e membro da Associação de Críticos de Cinema do Pará (ACCPA). Cursou Produção Audiovisual e ministra oficinas e cursos sobre crítica, história e estética do cinema.
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