- Gênero: Drama
- Direção: Ina Weisse
- Roteiro: Daphne Charizani, Ina Weisse
- Elenco: Nina Hoss, Sophie Rois, Thorsten Merten, Franziska Fauth, Johannes Kittel, Ilja Monti, Simon Abkarian
- Duração: 99 minutos
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Estudo de personagem que disseca uma vida em segredo até para si mesmo, A Professora de Violino segue Anna, uma mulher adentrando a meia idade em crises silenciosas. Tal qual a tradição do cinema alemão mais introspectivo, o filme não nos serve muitas certezas acerca de sua protagonista ou seus dilemas, somente pistas, e com essas peças de quebra-cabeça vamos tentando observar o mosaico cheio de impossibilidades criado por ela. Não há muito espaço para a respiração, apenas uma sensação constante de sufocamento; uma mulher que não se permite abrir, e que cada vez mais foge do que está em liberdade, escolhendo sempre o esconderijo.
Escrito e dirigido por Ina Weisse, uma reconhecida atriz alemã em sua segunda incursão atrás das câmeras com longas, entendemos o processo de acompanhar uma outra atriz, em pleno ofício, e dedicar-se a uma personagem tão exasperante, por tão recôndita, tão imersa em funções diárias (professora – mãe – esposa – amante) que lhe sobra pouco tempo para auto análise, e para livrar-se da tensão onde vive. Nós compreendemos a abordagem dessa conexão entre atriz e diretora – e uma que vivencia o mesmo processo de criação – e a defesa tão apaixonada que esse mesmo processo denominado filme lê dessa figura, cuja complexidade nem consegue ser absolutamente capturada, por espectador ou mesmo produção.
Há uma tentativa de manter Anna em posição estrategicamente afastada das soluções mundanas, sempre coberta por humanidade mas também por propósitos introspectivos em suas ações, ou até inações; não agir é agir. A Professora de Violino vasculha um universo cuja protagonista tem dificuldade de habitar, pois está lentamente tendo a compreensão de um novo território na própria vida, onde lhe falta poder decisório. Onde não apenas suas movimentações não criam reverberação, mas perceber-se incapaz de promover novas ondas ao seu redor, porque são de atribuição de outras pessoas, do qual não possui domínio. Essa perda de território é assistida pelo público, e seu eventual desespero mudo é palpável e angustiante.
É como acompanhar a queda das barreiras de um mundo que nunca se permitiu abrir, e Nina Hoss, uma atriz de vastíssimos recursos (vide Phoenix, por exemplo), é capaz de nos aproximar de alguém impenetrável. A educação repressora sob o qual Anna viveu a forjou daquela forma, e a faz reconhecer esse jugo; sua relação abismal com o pai, a forma como ela domina as relações de trabalho e diminui quem está na mesma posição que ela, o lugar de cobrança que ela ocupa no imaginário do filho, reproduzindo a aliança que estabeleceu no passado que ela não consegue reconhecer. Hoss é capaz de nos ampliar essa personagem até o máximo de empatia, mesmo que saibamos que ela é incapaz de evitar que tragédias circulem ao seu redor.
Mesmo diante de erros imperdoáveis, Anna segue inquebrantável em suas convicções, sem perceber que nenhuma relação sobreviverá ao seu domínio. As cenas de tensão crescente entre ela e seu mais novo aluno, que afetam a princípio sua trajetória materna até corroer a própria confiança que estabeleceu com o jovem Alexander, são o alicerce de uma tragédia que aconteceria a qualquer momento, porque o excesso de controle a adoece, literalmente. Sua personalidade autocentrada cega os elementos à sua volta, e tanto seu casamento quanto sua profissão correm um risco que ela não dá conta de resolver – o abismo está cada vez mais perto, e a personagem flerta com esse perigo inconsciente sem imaginar o mal que faz aos outros é provavelmente hereditário.
Weisse prende sua personagem em cenários claustrofóbicos, dos quais ela mesma se coloca vez por outra, se trancando ou observando o mundo de dentro pra fora. quando resolve enfim abrir uma janela em cena, é para provocar um ato de violência inconcebível a alguém que deveria paralelizar arte e liberdade. A Professora de Violino, em seu claustro psicológico que transtorna não apenas a personagem estudada, é um pequeno conto de terror contemporâneo sobre as formas mais perigosas de dominação, aquelas que surgem como pequenos traços de uma personalidade que está se desfazendo pela necessidade de controle que a sociedade impôs à mulher moderna, para se transfigurar em projeto totalitário que se expande pelo futuro até com um certo prazer pela transformação, em si e no futuro.
Um grande momento
“Não. Novamente.”