- Gênero: Comédia
- Direção: Dave Franco
- Roteiro: Dave Franco, Alison Brie
- Elenco: Alison Brie, Jay Ellis, Kiersey Clemons, Danny Pudi, Olga Merediz, Haley Joel Osment, Julie Hagerty, Ayden Mayeri, Fabi Reyna, Marian Li, Ted Rooney, Rochelle Maria Muzquiz, Loudon McCleery, Phillip Ray Guevara
- Duração: 106 minutos
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É engraçado como no cinema cada um enxerga aquilo que quer, ou deixa de enxergar aquilo que não quer. Como, por exemplo, ver gente dizendo que Alguém Que Eu Costumava Conhecer não pode ser confundido com O Casamento do Meu Melhor Amigo por ter uma protagonista que se afasta tanto daquela vivida por Julia Roberts. Será? Para mim, as duas estão ali bem próximas, não só pela situação, com tantos momentos e pontos de roteiro exatamente idênticos, mas pelo significado dessa busca por um passado perdido. Porque, afinal de contas, nunca foi sobre um melhor amigo ou um ex-namorado casando mesmo.
Distribuído pela Amazon Prime Video e estreia da semana na plataforma, o que o longa estrelado por Alisson Brie (Entre Realidades), que também assina o roteiro em parceria com seu marido, Dave Franco (Vigiados), diretor do filme, faz é trazer a história para um novo contexto. Ally é uma mulher da geração millennial, que seguiu a jornada bastante identificável de alguém que deixa sua cidade natal e rompe com as expectativas de uma configuração limitante em busca da realização de seus sonhos. Porém, as coisas não saem como esperado e, na frustração, ela decide voltar ao passado e àquele lugar onde talvez esteja o conforto perdido. Lá, precisa se confrontar consigo mesma.
Embora seja um movimento bastante humano, ele é muito característico da geração, e Alguém Que Eu Costumava Conhecer não nega, nem por um momento, ser um filme que quer falar sobre isso também, e sobre interação geracional, com personagens que marcam essas histórias de vida para além da protagonista Ally de Alison Brie; com a presença poderosa de Cassy, vivida por Kiersey Clemons (O Mistério da Ilha), numa limítrofe Z; e em menor evidência, mais ainda marcante, Libby, a mamãe boomer interpretada por Julie Hagerty (Apertem os Cintos, O Piloto Sumiu). É um filme de novos tempos, que fala da influência destes nas personalidades e vice-versa.
O palco para que essas dinâmicas se estabeleçam, o ambiente escolhido, é aquele definido como o meio mais fácil e lucrativo de contar histórias protagonizadas por mulheres para mulheres, aquelas que resgatam o mais cruel do amor romântico e reforçam tantos estereótipos: a comédia romântica. É uma ideia interessante e Alguém que eu Costumava Conhecer ganha pontos pela ousadia da atualização ao não ficar apenas naquela contextualização rasa de ambientação e contemporização de pautas que vê o filme chegar ao mesmo lugar de sempre.
O fato de Brie e Franco terem por perto de sua história O Casamento de Meu Melhor Amigo, um longa que já enfrentava algumas estruturas, como renegar o conflito entre rivais e o final padrão, é ótimo. Lançado em 1997, o filme de P.J. Hogan já é considerado um clássico do gênero, bastante conhecido e com uma trama repleta de momentos marcantes bem aproveitados no jogo de reconstrução temporal aqui proposto. O passado de Ally e Sean está distante do de Julianne e Michael pela existência de um relacionamento amoroso concretizado, não-platônico, e o reencontro resulta de um movimento individual de busca, que não se relaciona diretamente, ao menos não num primeiro momento, com o romance.
Seguindo a mesma trilha de eventos após a descoberta do noivado, reconhecem-se em Alguém Que Eu Costumava Conhecer questões existenciais que não se transformam, mas ninguém vai encontrar ali a pressa em casar pela chegada de certa idade (28 anos, gente!); certos pudores e julgamentos do passado, em especial relacionados ao corpo; ou qualquer dissimulação farsesca com um personagem estereotipado. O longa também ganha por tratar dos relacionamentos de uma maneira menos fantasiosa e idílica, uma vez que já experimentados e, em certo ponto, fracassados; que afetaram ou foram afetados por várias decisões.
Em uma esfera mais pessoal, o indivíduo adquire um novo contorno, com questionamentos sobre realização e prazer que o filme anterior apenas cogitava fazer. No confronto entre Ally e Cassy é possível destrinchar a relação de identificação e indefinição. Quando a outra ocupa o espaço perdido e talvez nela se percebam traços de um passado impossível, não só agora, mas sempre.
Afastando-se de Ally, em Libby, a mãe, percebe-se a marca de uma libertação sexual que existe não só na sociedade atual, mas na própria representação em tela – ainda cheia de pudores e preconceitos em relação ao corpo da mulher, mas presente – dos personagens da mesma faixa etária, algo que não se via há pouquíssimo tempo atrás, imagine em uma comédia romântica dos anos 1990. Pensando em Cassy e Kimberly, as noivas de então e de antes, na relação delas com família, trabalho e futuro, já é possível notar uma confluência de convenção e escape, a manutenção do padrão e uma oportunidade de fuga. Agora, com imposições de personalidade incisivas desde o primeiro momento e rupturas mais impactantes. O desfecho é interessante.
Porém, nele se percebe algo que percorre todo o filme, seja no modo como Franco monta suas peças ou como ele e Brie pensaram essa história, seus personagens e os diálogos. Por mais que essa contextualização tenha tantos pontos positivos e interesse, há uma superficialidade em Alguém Que Eu Costumava Conhecer, um mergulho artificial em boa parte dos conflitos, que nunca chega verdadeiramente a convencer. Entre coadjuvantes vazios e mal aproveitados e sequências desconectadas do todo, a busca pelo passado como significado de reencontro e reconstrução, ponto-chave da produção, perde um pouco de sua força.
Ainda assim, Alguém Que Eu Costumava Conhecer é uma comédia romântica que agrada por apostar no incomum e se destaca pela experiência de perceber o passar do tempo através de protagonistas diferentes que vivem tramas irmãs separadas por mais de 25 anos. E permitir conhecer as pessoas que habitam – e influenciam – universos distintos estruturados da mesma forma; reconhecendo as mudanças e as características de cada geração.
Um grande momento
O reencontro