Crítica | Festival

Accepted

Exclusão educacional

Vamos falar sobre meritrocacia? Em um mundo desigual, classista, as coisas estão muito longe de funcionar como são pintadas pelas elites de todo o mundo. O privilégio é algo que mais do que abrir portas, tem o poder de cegar. A pressão para vencer é sufocante para uma grande parcela da população e isso fica muito evidente no documentário Accepted, de Dan Chen. Em uma pequena cidade da Louisiana, quatro adolescentes acreditam ter encontrado o caminho para cruzar a linha que separa a oportunidades da promessa. A esperança está na TM Landry Prep School, um colégio que ostenta um índice de 100% de aprovação nas melhores universidades dos Estados Unidos. À frente da instituição está o carismático e autoritário de Mike Landry, que se apresenta como “guardião de futuros”.

Accepted observa os jovens de perto, como se caminhasse ao lado deles da casa até a escola, buscando o peso de cada expectativa, de cada tentativa de corresponder ao sonho que lhes foi vendido. Quando o New York Times revela que por trás das façanhas acadêmicas existem distorções, pressões extremas e métodos questionáveis, tudo desmorona. O que era uma estrada de acesso se torna uma trilha incerta, e o filme acompanha o impacto disso em olhares, silêncios e decisões que ninguém dessa idade deveria ser forçado a tomar.

Chen alterna o retrato íntimo dos estudantes — seus quartos, suas famílias, seus medos — com a anatomia de um sistema que privilegia quem já nasceu com vantagem. O documentário não se limita a expor a figura do fundador, mas procura compreender o que o levou a acreditar que manipular e endurecer era o único caminho para a chegar lá. Nessa tentativa, evidencia a desigualdade estrutural que obriga jovens a carregar um fardo que deveria ser de toda a sociedade.

Além da transformação desses quatro adolescentes, Accepted mostra que o sonho universitário, tão alardeado como prova de mérito, é também uma prova de resistência. E que, para quem já não tem privilégios, ser aceito nunca é apenas entrar em uma faculdade, mas enfrentar a todo momento a pergunta sobre o preço a pagar por essa entrada.

Um grande momento
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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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