- Gênero: Comédia
- Direção: Greta Gerwig
- Roteiro: Greta Gerwig, Noah Baumbach
- Elenco: Margot Robbie, Ryan Gosling, America Ferrera, Kate McKinnon, Issa Rae, Rhea Perlman, Will Ferrell, Michael Cera, Ariana Greenblatt, Ana Cruz Kayne, Emma Mackey, Hari Nef, Alexandra Shipp, Kingsley Ben-Adir, Simu Liu, Ncuti Gatwa, Scott Evans, Jamie Demetriou, Connor Swindells, Sharon Rooney, Nicola Coughlan, Ritu Arya, Dua Lipa, Helen Mirren
- Duração: 114 minutos
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Há uma história por trás da boneca Barbie. Ela foi criada no fim dos anos 1950 por uma família que queria dar tridimensionalidade às bonequinhas de papel que trocavam de roupa, e possibilitar às meninas brincar não apenas com reproduções de bebês. Conta-se que, à época, Ruth Handler, então CEO desta empresa familiar chamada Mattel (junção do nome de seu marido, Elliot, e do sócio, Matt), se inspirou ao ver que sua filha e as amigas estavam brincando de ser empresárias, milionárias e não mães e donas de casa. E, sim, essa é a grande revolução de Barbie, fazer com que o brinquedo deixasse de ser um objeto limitante do papel da criança, mas passasse a ser uma representação da própria criança em seus jogos de imaginação. Inclusive, e não por acaso, é a referência divertida ao clássico de Kubrick, 2001 – Uma Odisseia no Espaço, que Greta Gerwig coloca na abertura do filme para mostrar o início de uma nova era.
Pensando em retrospecto, enquanto a domesticicidade ainda era idealizada e o feminismo dava seus primeiros passos, o lançamento comercial da Barbie marca a sua geração. Com o tempo, a boneca ganha novos modelos, profissões e um namorado, o Ken. Não necessariamente nessa ordem. Porém, por muito tempo, seu corpo, idealizado como um manequim, é magro e curvilíneo, sua pele branca e a modelo que se perpetua tem longos cabelos loiros, ou seja, a representação é extremamente restrita e o padrão de beleza, quase inatingível. Se ela mostra que as mulheres podem ser o que quiserem, não apenas donas de casa, talvez seja só um grupo muito específico de mulheres. Isso sem falar que nem todas podiam ter uma Barbie para chamar de sua.
![Barbie](https://cenasdecinema.com/wp-content/uploads/2023/07/Barbie_interno1-1024x488.jpg)
Sem deixar de ser divertido nem por um minuto e muito menos sem fingir que não está ali como um produto, o filme de Gerwig vai procurar essas fissuras. Barbie se passa em dois universos: o do faz de conta, onde as Barbies vivem uma vida cor de rosa e feliz, e a vida real onde tudo é o que é mesmo, e as bonecas são só brinquedos. Tudo começa a se atrapalhar quando a Barbie Estereotipada – a boneca bem padrão loira, magra e perfeita vivida por Margot Robbie – começa a pensar na vida e ter sentimentos melancólicos e celulite. Quando seus calcanhares encostam no chão, ela precisa ir procurar sua dona no mundo real e seu Ken, o também loiro e sarado Ryan Gosling, resolve acompanhá-la.
Na Barbielândia, as Barbies já passaram pelas transformações que a linha de bonecas também passou recentemente e a Estereotipada é apenas mais uma boneca em meio a uma variedade de outras de cores e formatos de corpos. Issa Rae, Ritu Arya, Hari Nef, Emma MacKay, Sharon Rooney, Dua Lipa e Kate McKinnon estão entre as habitantes do lugar e acreditam piamente serem as responsáveis pela grande revolução feminista no mundo real. Se onde moram tudo é determinado, conduzido e resolvido pelas mulheres, sendo cada Ken um mero detalhe, não há porque no mundo real também não ser assim. Bom, não é.
![Barbie](https://cenasdecinema.com/wp-content/uploads/2023/07/Barbie_interno2-1024x509.jpg)
A gente está indo bem, mas agora a gente disfarça
A narração em off do início do filme já indicava a ironia que marcaria o tom do filme, e o roteiro da própria Gerwig, em parceria com seu companheiro Noah Baumbach, cumpre o esperado. O questionamento do papel negativo da Barbie no imaginário da mulher, sua influência no ideal feminino e as consequências dessa representação por tanto tempo estereotipada rendem bons momentos, em especial nas interações com a jovem Sasha (Ariana Greenblatt), assim como todas as passagens em que Robbie tenta se entender naquela nova realidade completamente inesperada.
O modo com que o filme retrata não só o absurdo imaginado como perfeito, mas o cinismo do mundo real, ao trazer coisas tão antigas que não mudam nunca, como o comportamento dos homens no canteiro de obras ou na delegacia de polícia, e até mesmo como achincalha a distribuição de poder dentro da própria Mattel, empresa hoje sob comando de Bryan G. Stockton, é preciso. Se há uma coisa que a dupla entende bem e demonstra aqui é que o humor é uma boa arma para expor aquilo que precisa ser destacado. É interessante como o filme ilustra, com ícones como Stallone, Clinton, Reagan e cavalos, o poder do macho e do patriarcado, e como trabalha com isso na contaminação de uma sociedade, passando necessariamente pela masculinidade tóxica e até pela relação abusiva, e em uma possível transformação.
![Barbie](https://cenasdecinema.com/wp-content/uploads/2023/07/Barbie_interno3-1024x480.jpg)
Entre suas muitas cores e momentos cômicos, mesmo sendo um produto de marketing, o longa mergulha em lugares mais profundos e vai falar de coisas sérias, como a eterna invalidação da mulher, porque quem não é mulher talvez não saiba, mas o discurso de Gloria (America Ferrera), a humana da Barbie Estereotipada, serve para todas, sejam elas quem forem, estejam onde estiverem e ocupem o cargo que ocuparem. Porque longe da Barbielândia, todas precisam sempre provar ser mais do que são. E é importante que muitas meninas vejam isso por aí. Maiorzinhas, é bom lembrar, porque não é um filme para crianças.
Assim, Barbie segue alterando o curso da história, agora entrando na briga com os outros filmes de vender boneco, mas fazendo mais uma vez do seu jeito. É filme de vender boneca, sim, e nem teria como não ser, já que é um filme da Barbie. Mas é uma delícia, e tem muita coisa ali no meio que vai além disso.
Um grande momento
Ser o que é
Depois desse texto, fiquei mais ansiosa ainda pra ver!!!!!!!