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Fale com as Abelhas

Atuações interrompidas

(Tell It to the Bees, GBR, SWE, 2018)

  • Gênero: Drama
  • Direção: Annabel Jankel
  • Roteiro: Henrietta Ashworth, Jessica Ashworth
  • Elenco: Billy Boyd, Gregor Selkirk, Anna Paquin, Euan Mason, Holliday Grainger, Lauren Lyle, Kate Dickie, Emun Elliott, Isaac Jenkins, Joanne Gallagher, Rebecca Hanssen
  • Duração: 108 minutos
  • Nota:

Se até hoje a homossexualidade é alvo de preconceito, imagina como era a vida de quem se sentia atraído por pessoas do mesmo sexo em 1950? Em Fale com as Abelhas, Dra. Jean Markham foi uma das pessoas perseguidas e, de certa maneira, expulsa de sua cidade natal por ter se apaixonado por sua melhor amiga. Ela é peça fundamental do longa de Annabel Jankel, embora este não seja sobre ela, mas sim sobre o pequeno Charlie Weekes e sua mãe, Lydia Weekes. Em uma pequena cidade do interior da Inglaterra, ambos vivem em um lar desfeito, sob a vigilância e maledicência constante dos outros moradores, tentando sobreviver e encontrar alguma perspectiva.

Baseado no romance de Fiona Shaw, o filme tem uma doçura por tentar exprimir essa realidade sob o olhar do pequeno Charlie, com seu encantamento e também com suas supervalorização, curiosidade e incompreensão sobre os acontecimentos. Em seu amadurecimento e descoberta, encontra nas abelhas companheiras de jornada e faz delas suas confidentes. Embora haja uma amarração e uma trama fluida, o filme tem amarras que não o deixam deslanchar. Há sequências ótimas, mas elas são intercaladas por passagens de pouco envolvimento, que podem ser flashbacks ou tramas temporais paralelas, que fazem com que se esvaiam.

Fale com as Abelhas

Ainda assim, o roteiro traz personagens fortes, quase todos com um background determinado e coerente. Alguns deles se destacam, como a gentil Annie, a soturna Pam ou até mesmo o intragável Robert, outros são indeterminados. A rede que conecta todos também é bem estabelecida e seria ainda mais proveitosa se não houvesse aquilo que as autoras, seja Shaw, que escreveu o livro, e as irmãs Ashworth, que o adaptaram, ou Jankel que o dirigiu, consideram tão importante: a confabulação do pequeno Charlie com as abelhas.

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As interrupções para as confissões, ora silenciosas, ora não, são espaçadas, mas quando acontecem são claramente sentidas. A quebra de ritmo vem justamente por Fale com as Abelhas ser um filme que depende tanto do jogo cênico, com atuações muito precisas e um elenco afiado. O andamento vai sendo conduzido por essa troca e segue num crescente, assim como a paixão entre as personagens de Jean e Lydia, com Anna Paquin e Holliday Grainger impecáveis nos papéis, aliás.

Fale com as Abelhas

Porém, do mesmo jeito que a linha das relações tem o seu desfecho, a das interrupções tem o seu, e é esse terceiro ato que não faz muito sentido em comparação com o resto do filme. Se ele é todo construído nesse crescente, nessa construção, a ruptura brusca faz o espectador encontrar-se em um lugar que ele não foi preparado para estar. O exagero das sequências e a vontade de dar potência ao clímax fazem Jankel perder a mão dos efeitos visuais e escorregar em elementos que sabemos reais e que se repetem incansavelmente no audiovisual mas são tão combatidos hoje em dia pela desnecessidade de exposição.

Fale com as Abelhas é um longa que se perde em sua própria irregularidade. Apesar de não ser um mau filme e de estar cheio de coisas positivas, seus tropeços e solavancos não deixam que a história alcance o potencial prometido em um primeiro momento. Desperta um interesse temático, impressiona (bastante) pelas atuações, e tem em sua parte técnica nomes que merecem uma atenção especial para o futuro, como a compositora Claire M Singer, mas não chega onde deveria.

Um grande momento
Pam e Lydia na porta da mercearia

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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