Crítica | Streaming e VoDDestaque

O Melhor Lugar da Terra

Um homem e seu lugar

(La Gran Seducción , MEX, 2023)
Nota  
  • Gênero: Comédia
  • Direção: Celso R. García
  • Roteiro: Celso R. García, Luciana Herrero Caso
  • Elenco: Guillermo Villegas, Pierre Louis, Yalitza Aparício, Eligio Meléndez, Julio Casado, Héctor Jiménez
  • Duração: 88 minutos

Todos nós já vimos esse filme: um sujeito meio metido, meio arrogante, é mandado contra a sua vontade para um ‘fim de mundo’ desses qualquer, sem qualquer conforto, longe de seu habitat natural, e acaba descobrindo lá uma humildade desconhecida, um amor inesperado e um lar onde não imaginava. Hollywood já nos apresentou essa premissa incontáveis vezes, e tudo quanto é parte do mundo já fez versões dessa mesma ideia. Agora, e se esse lugar bucólico onde se encontra a felicidade, fosse uma farsa? Esse é o ponto de partida de O Melhor Lugar da Terra, estreia de hoje da Netflix que tenta ser o candidato do México ao próximo Oscar de filme internacional. É uma subversão de uma ideia cuja originalidade já não existe mais, e que encontra nesse olhar diferenciado uma forma de recontar a mesma história, de um novo modo. 

O diretor Celso R. García encontra nos braços do streaming uma forma de angariar novas possibilidades para seu nome (ele é o diretor do badalado A Estreita Faixa Amarela), através de uma forma marota de afeto: o de um homem pelo lugar que ele chama de seu. O Melhor Lugar da Terra é uma maneira doce de falar de temas bem pertinentes e, dependendo do olhar, até um pouco desconfortáveis, como a migração compulsória e o afastamento do espaço de origem por quem não quer deixá-lo. Em paralelo a isso, também tratar desse homem do campo que ama sua terra, não pretende se separar do lugar onde nasceu e transforma essa convicção em combustível para mudar toda a sua realidade. Mas será que essa propaganda não é uma forma de evitar a ascensão de uma classe, intelectualmente falando?

Mostrados com certa inocência, profunda sagacidade e uma esperteza até interesseira, os habitantes do povoado de Santa Maria, em uma ilha afastada, criam um conceito de felicidade que os beneficie, na busca de um bem maior, que é sua própria salvação. Para isso, abrem mão de alguns escrúpulos, mentindo descaradamente para um homem que os considera amigos. Sabemos onde isso vai chegar ao final, com muitas mudanças de ambas as partes, mas até lá o que vemos é um grupo de trapaceiros que almejam conquistar algo através de um engano – e isso faz parte de seu DNA, vide as situações dos seguros desempregos fraudados. O Melhor Lugar da Terra lida com esse grupo que tenta esquecer dos meios para justificar os fins, e acaba caindo na sua própria armadilha. 

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Nas entrelinhas, o roteiro está tratando de uma maneira leve sobre questões prementes principalmente em países emergentes e/ou pobres, onde a migração é necessária como complemento a uma vida que muitas vezes se resume à subsistência, para que um futuro seja planejado, ou mesmo sonhado. O Melhor Lugar da Terra, aquele lugar que muitas vezes representa sua origem, é, para muitos, um sinal de retrocesso e aprisionamento, representando uma ausência de opções. Podemos dizer que os personagens do filme apresentam uma fatia da população, mas que a produção escolhe não mostrar esse lado, das pessoas que gostariam de ir embora e, por algum motivo, não conseguem. De alguma forma, García tem uma visão romântica do lugar de Germán e companhia, pessoas que verdadeiramente optaram por encontrar o lado bom de sua situação. 

Da interação entre esse grupo e seu “refém”, nasce uma produção simpática e calorosa, que reencontra a Yalitza Aparício de Roma e vê em Guillermo Villegas um protagonista arrebatador. Ainda assim, não se trata de um filme que aproveite todo seu campo de ideias. Por trás do que mostra a superfície de O Melhor Lugar da Terra, existem mais lados do ser humano, que habita em maiores camadas de complexidade do que o roteiro apresenta. Ainda assim, com os clichês tão facilmente reconhecíveis que ele apresenta e suas curvas que os mudam, existe em tela uma vontade grande de observar o melhor dos indivíduos e sua ligação com o lugar que os concebeu, e fez deles o que eles são, para o bem e para o mal. 

Um grande momento

Do restaurante para o bingo

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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