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Uma Boa Pessoa

A cura que não vem

(A Good Person, EUA, 2023)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Zach Braff
  • Roteiro: Zach Braff
  • Elenco: Florence Pugh, Morgan Freeman, Molly Shannon, Celeste O'Connor, Chinaza Uche, Zoe Lister-Jones, Nichelle Hines, Brian Rojas, Alex Wolff
  • Duração: 125 minutos

Continuo achando a prática de não assistir trailers e não ler sinopses de um acerto sem fim, pois é isso que está fazendo com que títulos como Uma Boa Pessoa ganhe relevância junto ao imenso número de estreias mensais, entre cinema e streamings. O ponto de partida do filme parece que é anunciado desde os primeiros minutos; desde quando o cinema estadunidense produz filmes sobre ser feliz, apenas? Não. As pessoas precisam antes sofrer a maior das dores, ser infligida pelas maiores atrocidades do destino, para então ser lhes dada a dádiva da felicidade. É assim que na primeira cena aqui já sabemos que aquele retrato de qualidade de vida será quebrado para dar lugar ao horror, real, psicológico ou ambos. O que me surpreendeu positivamente é a que horror específico está sendo referido. 

A estreia na direção do ator Zach Braff aconteceu há 20 anos, com o elogiado Hora de Voltar, e desde então ele não conseguiu reproduzir aquelas resenhas. Esse Uma Boa Pessoa é só o seu quarto longa, e sua recepção foi igualmente morna; os motivos para considerá-lo nesse lugar, no formato, até são compreensíveis. No entanto, o filme faz parte de uma zona de reconhecido lugar de cinema, que assistimos com frequência acima do permitido, com lançamentos ilimitados de produções que sonham com Sundance, Tribeca e SXSW. Algo já foi percebido no cinema de Braff, que é um apreço pelos personagens, uma leitura mais debruçada sobre seus mundanos dramas, e uma vontade de compreender suas motivações, além de contar com uma boa vontade de seus elencos, que lhe entregam um relevo dessa caracterizações que começam no texto dele. 

A Allie de Florence Pugh, por exemplo, é uma figura tridimensional, que vende uma certa efusividade típica da paixão nas primeiras cenas, para em seguida afundar-se em um lugar que não é necessariamente da dor, mas de algo mais inanimado e sem nome. As muitas perdas pelo qual ela está exposta vai revelando camadas de muitas problemáticas do contemporâneo, tais como o vício em opióides, a ansiedade, a depressão de visual menos óbvio, a necessidade de isolamento. É um trabalho coletivo, não exclusivo de Pugh, que se elabora dentro de um contexto visual e narrativo, onde a mão de Braff está muito presente. Quando o rosto da atriz se revira muitas vezes durante uma estadia na cama, o desconforto é explícito durante uma madrugada, Uma Boa Pessoa se mostra um reflexo contundente de um sistema doentio sobre o qual se fala ainda muito pouco, onde falta responsabilidade no filmar.

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Ao lado dela, também Braff tira de Morgan Freeman sua atuação mais comprometida em mais de uma década. O vencedor do Oscar por Menina de Ouro não apenas tem aceitado coisas ruins, como tem trabalhado demais, e parece diluir seu tamanho; esse mês que passou Freeman foi visto aqui e em duas atrocidades, Muti e Crime na Rodovia Paraíso. É bom então ver que o ator, quando valorizado, valoriza de volta seu veículo; há muita de sua conhecida sinceridade em cena, em um texto que sabe ler seus melhores predicados. Com a adição de Pugh e da jovem Celeste O’Connor ele emociona verdadeiramente, e não há como negar as capacidades de seu autor em conseguir encontrar os atores certos para cada personagem. O que vemos, enfim, é um profissional que parece não fazer qualquer esforço para tocar as teclas certas. 

Ao percebermos que Uma Boa Pessoa trata de um típico filme de acerto de contas com os próprios erros, o que Braff faz de especial por aqui, que talvez ressignifique o todo, é mostrar que não existe apenas um erro, mas muitos e de todos os envolvidos. O que unia esses personagens um ano antes do desenrolar da trama era o amor e a tentativa de reconciliação; a segunda questão segue, e no lugar do amor entram os muitos perdões que precisamos conceder. Em uma cena capital, Freeman fala a Pugh para ela parar de culpar os outros por algo que ela mesma fez, e a complexidade do todo nos mostra algo cheio de lados. Sim, Allie já sabia de sua culpa, e ao mesmo tempo ela é assolada pela possibilidade de precisar assumir algo tão devastador. São grupos de singelezas como essa que tiram os limites da produção. 

Trata-se de não subestimar a capacidade do público de abordar frontalmente questões mal retratadas ainda, e se Braff não se compreende como um diretor com predisposição imagética marcante, seu entendimento do seu universo, das suas personagens e de seu lugar de observador, compensam suas ausências. Uma Boa Pessoa não está no caminho de tornar-se um clássico, mas sim uma competente reunião de atores a um autor que extrai o melhor do que cria, na direção dos mesmos ou no olhar para sua narrativa. Há consciência de que está sendo elaborado um pensamento sobre doenças invisíveis à primeira vista, e que a cura estará sempre na capacidade particular do reencontro, quando aprofundamos esse mesmo olhar. 

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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3 Comentários
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Eliana
Eliana
24/09/2023 00:39

Posso criticar o crítico? Rsrs. Melhora sua escrita, meu caro. Tem erros de pontuação no seu texto. Ah, por favor, pode colocar aspas quando escrever o título de um filme? Sua crítica está bastante ácida e rasa. Tenho a sensação de que não assistimos o mesmo filme, rsrs.

Paulo RT
Paulo RT
12/09/2023 02:13

Tchê. Para a GRANDE maioria dos cinéfilos, os que não entendem inglês, que precisam de legendas, nunca dublagem, é lamentável o descaso, preguiça, em legendar as canções do e de filmes, já que elas têm muito a ver c o filme. Acabem com essa preguiça. E Morgan e Florença dão show de interpretação.

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