Crítica | Festival

Um Filme Dramático

Busca vida

(Un Film Dramatique, FRA, 2019)
Nota  
  • Gênero: Documentário
  • Direção: Eric Baudelaire
  • Roteiro: Eric Baudelaire
  • Duração: 122 minutos

Que filme realizar, ao ligar uma câmera? Quais são as certeza que aguardam cada cineasta, cada profissional do cinema? Um Filme Dramático, produção francesa dirigida por Eric Baudelaire, é um documentário que incute no espectador as dúvidas empíricas que residem no outro lado da cadeia cinematográfica. Se as questões não são necessariamente novas no fazer cinema, nem o dispositivo utilizado pelo documentário parece inédito, ao menos as relações humanas que nascem, no lugar que nascem, e o que elas geram, talvez acumule um amálgama esse sim mais fresco e inexplorado, com seus personagens rejuvenescendo essas inquietações típicas.

Questionar o que filmar, como filmar e o que fervilha no encontro de uma equipe é feito por Eric, mas nem o espectador nem seus “atores” percebem isso de cara. Ao invadir uma escola e seus estudantes mais jovens no subúrbio de Paris, o cineasta analisa essa geração cuja imagem vem sendo auto-explorada através dos inúmeros vetores que criam material imagético hoje. Não há julgamento nem é feito nenhum juízo de valor a respeito de como se relacionam entre si, e de como eles comercializam suas próprias cenas na sociedade atual, ávida por conteúdo audiovisual de qualquer espécie, principalmente se o mesmo tiver o seu aval.

Um Filme Dramático

Gradativamente, esses grupos são formados, as rodas de conversas entre eles parecem cada vez mais reuniões de produção, e por fim eles se armam: com câmeras, microfones captadores de áudio, claquetes e atores selecionados, um filme começa a tomar forma através da metalinguagem mais prosaica – são imagens capturadas por eles mesmos, com discussões promovidas por eles mesmos, em exercícios derivados dessa interação típica de uma produção real, e é assim que nasce não apenas um filme dramático, como também Um Filme Dramático.

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Eric reconhece que o espaço onde os encontra é exíguo para moldar a imaginação necessária para um filme, então os alunos são soltos em zonas minimamente controladas para que experiência seja enriquecida. Esse jogo do filme dentro do filme já alimentou muitos documentários, a novidade aqui é descontrolar um grupo de crianças e pré-adolescentes livres em seus questionamentos, que o filmes baseia em lugares entre o cinema e a contemporaneidade, uma ação influindo na outra. Desse mix de eventos, o filme consegue explorar os múltiplos lados de interesse do projeto.

Um Filme Dramático

Seguimos então esses personagens que acabam se revelando muito mais complexos e imprevisíveis do que esperaríamos, tanto quando reunidos quanto em separados, ao observarem o mundo que retratam e retransmitem. O que o diretor tenta fazer, aos poucos, não é apenas construir camadas de aprendizado cinematográfico aos seus personagens, mas absorver o que também eles estão criando em matéria de textura. Dessa intersecção entre o que se espera, o que se quer e o que se consegue, é que aflora na produção, uma mistura bem dosada de cinema observacional, documentário em primeiras pessoas e um toque de imprevisibilidade.

Ainda que nada do que foi conseguido tenha necessariamente sido buscado pelo autor, é dessa fricção que Um Filme Dramático se estabelece enquanto peça de cinema. Se não há algo de novo na frente das câmeras de Eric, provavelmente existe na frente das câmeras que o filme serviu aos seus “atores”, através dos tempos – ao menos um personagem seguimos acompanhando e o fascínio por ele não cessa. É dessa jovialidade e de suas reações inesperadas que brotam a verdadeira razão de ser do filme, e que espelha uma geração que quer ver e ser vista, ouvir e falar.

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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