Crítica | Festival

Every Day in Kaimuki

O lugar que sou

( Every Day in Kaimuki, EUA, 2022)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Alika Tengan
  • Roteiro: Naz Kawakami, Alika Tengan
  • Elenco: Naz Kawakami, Jordan Cheng, Tyler Ebisuya, Lisette Marie Flanary, Kawika Kahiapo
  • Duração: 81 minutos

Há pouco eu falei sobre Cha Cha Real Smooth e esse subgênero do cinema indie que retrata jovens adultos tentando encontrar o seu lugar no mundo e que tem estado tão presente nos festivais estadunidenses ultimamente. Mais um exemplar nesse álbum pessoal de figurinhas, Every Day in Kaimuki, de Alika Tengan, conta a história de um cara que está saindo pela primeira vez do Havaí para morar em Nova York, não por algo que conseguira lá, mas acompanhando a namorada. O vemos tentando resolver o transporte para o gato, se desfazendo das coisas, ensinando o seu substituto na estação da rádio comunitária onde trabalha e vagando de skate pelas ruas da cidade enquanto descobrimos aquilo que o incomoda e define. 

Perfeitamente enquadrado na tendência do subgênero, o longa tem um cunho pessoal destacado. Não esqueçamos (como se eles deixassem) que são filmes que falam sempre de si de maneira evidente. Aqui, o protagonista, Naz, é vivido por Naz Kawakami, que também assina o roteiro ao lado do diretor. Porém, a questão do deslocamento e da ruptura com o estabelecido, mesmo que permeada por alguns clichés, traz algum interesse genuíno à trama. É como se houvesse um algo além do olhar apenas para aquele indivíduo, em situações e eventos vividas por ele que encontram efetivamente uma universalidade, na perda do seu lugar de reconhecimento, no risco do desconhecido. 

Por trás da jornada comum, há questões que transcendem o óbvio, o cotidiano. São lembranças de uma ancestralidade não tão evidente, mas que está no orgulho de nunca ter se afastado da ilha e o modo como olha para esse futuro validado pela distância. A marca de territorialidade, que em Every Day in Kaimuki ganha muitos pontos e conotações extras, dá uma relevância a Naz, tornando-o mais do que aquele cara que espera a vida passar acomodado, ouvindo suas músicas, andando de skate, brigando por aí e dependendo de sua namorada, igual a tantos outros personagens que repetem figuras nem sempre interessantes da vida real. 

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Artesanal, Tengan trabalha com a imagem crua, simples, granulada numa fotografia curiosa de Chapin Hall. Ambos transitam entre o espontâneo e o elaborado, e criam belos quadros. São achados de iluminação em andanças pela rua, escolhas de plano nas internas, posicionamentos do personagem em cena que fazem do filme uma experiência estética igualmente interessante, embora a sensação de colagem nunca deixe de estar presente. A montagem a quatro mãos de Kali Kasashima e Jason Zeldes reforça isso.

Mas segue-se ali. Ao lado de Naz e talvez nem tanto pela vontade de estar com ele, mas pelo poder (ou não) testemunhar seu deslocamento. Em seus deslizes e lugares-comuns, Every Day in Kaimuki fala de coisas interessantes e, longe de ser mais um dos tantos pós-coming-of-age de foco único e exclusivo no indivíduo que se enxerga único, caso do filme de Cooper Raiff e tantos outros, encontra uma diferença para chamar sua e levá-lo a outras conexões, tornando-se especial.

Um grande momento
Frustrado à noite de skate

[2022 Bentonville Film Festival]

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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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