- Gênero: Ação
- Direção: Matt Reeves
- Roteiro: Matt Reeves, Peter Craig
- Elenco: Zoë Kravitz, Robert Pattinson, Paul Dano, Barry Keoghan, Amber Sienna, Colin Farrell, Peter Sarsgaard, John Turturro, Andy Serkis, Jeffrey Wright
- Duração: 175 minutos
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As histórias em quadrinhos mudaram a indústria cinematográfica nas últimas décadas. Por trás de muito marketing, a cada ano, títulos chegam para ocupar em massa as salas de exibição, disputar a atenção de fãs que querem mais e mais filme com seus heróis favoritos, e render muito dinheiro aos produtores, estúdios e editoras interessados. Como em tudo nesse mundo, em meio a milhares de dólares gastos e ganhos, há o que se aproveite, cinematográfica e contextualmente. Agora, um dos mais fascinantes heróis volta aos cinemas, depois de várias adaptações. Batman, o órfão rico sem super-poderes que usa a sua fortuna para capturar vilões e combater o crime em sua cidade, se vê em meio a assassinatos de figurões da política do lugar. Fruto de um projeto que tinha tudo para ser muito mais comercial, fácil e talvez pior do que é, assinado por Matt Reeves, o filme se descola do Universo Estendido DC, se transforma e entrega algo.
Assinando o roteiro, Reeves e Peter Craig voltam a histórias publicadas, mas não se atêm aos plots já escritos antes. Na verdade, buscam a ambientação e detalhes para construir sua própria Gothan em frangalhos, consumida pela corrupção, e estabelecer a rede que possibilitará um novo enredo para o filme. Nesse ambiente, falam dos traços que sempre acompanharam Batman, como a complexidade de sua personalidade e a tênue linha entre a sanidade e a loucura, além de tratar outros temas como o medo como ferramenta de coerção social, e a legitimidade do justiçamento. Apesar de haver a possibilidade de se aprofundar neste lado humano e social, há uma necessidade de criar uma trama elaboradíssima que abarca toda a cidade e mais um pouco; passado, presente e futuro, e que precisa de conexões extensas e excessivas, múltiplos personagens, e muitas idas e voltas. Algo nem sempre é positivo para o andamento equilibrado de um filme.
Por outro lado, se há muitos momentos de ausências e prolongamentos desnecessários, as opções do diretor são de encher os olhos. Ao resgatar o homem-morcego detetive, incorporando o noir e quadrinhos, o novo Batman assume uma estética opressiva. Há poucos espaços que não sejam sujos e sem cores, e o clima é pesado e grave. O diretor ressalta o sentimento com quadros fechados, sufocantes, inclusive em momentos onde isso não é nada usual, o que é interessante; e com a trilha grave, nem sempre comedida, o que não é tão bom assim. Quando parte para a ação, Reeves também faz bonito em cenas bem coreografadas e ousadas, com uma fotografia inspirada de Greig Fraser, indicado ao Oscar 2022 por Duna. Sequências como a luta iluminada por rajadas de balas empolgam, assim como a inventiva perseguição que não valoriza o confronto entre os dois elementos, mas deposita toda a tensão em tomadas internas, close ups ou em planos isolados, mesmo que venha depois de um esquisito fan-service.
Paralelo a isso, o longa encontra em Robert Pattinson alguém para sustentar adequadamente o uniforme do herói. Fora da armadura, ele se retrai no recluso Bruce Wayne, criando uma outra persona, bem diversa de seus parceiros de personagem, condizente com o universo aqui criado e embalado pelo tom deprimido. Dentro dela, compreende que o vigilante está muito além da voz ou da amplitude dos movimentos, estabelecendo conexões e transmitindo sensações e sentimentos através do olhar. É assim quando vê o filho do prefeito Mitchell pela primeira vez ou fica fascinado por Selina Kyle. Junto com ele, Paul Dano também aparece inspirado, com um personagem que exige o tom elevado, mas não ultrapassa o limite. Outros colegas de cena têm bons momentos, como Zoë Kravitz, John Turturro e Colin Farrell.
Porém, ainda que conte com Pattinson, um bom elenco e por mais que Batman seja impressionante esteticamente, e isso se mantenha durante todas suas 3 horas, alternando entre a depressão e a ação, sem nunca deixar a tensão se perder, seria muito difícil que a forma sustentasse um conteúdo irregular por tanto tempo. Os tropeços do filme acabam se destacando entre uma cena ou outra, quando uma personagem passa muito tempo sem aparecer, quando algo se perde em prolongamentos desnecessários ou, pior, quando as várias soluções facilitadas e estapafúrdias vão se apresentando, e isto acontece o tempo todo. Há tanta coisa positiva nas opções arriscadas do filme, como quando iguala o ambiente de Wayne à realidade de Gothan, retirando a pompa e o glamour, para entregar conflitos em matérias televisivas rápidas ou conversas em leitos de hospital, porque, simplesmente, colocou tanta coisa no filme que não teve tempo para trabalhar melhor as informações, que isso é frustrante. E há casos ainda mais rasos de facilidade, que quase lembram o seriado dos anos 1960, algo que não combina aqui.
Ainda assim, nesse duplo e no sentimento dúbio que Batman causa, enquanto afasta, há o que nos faça ficar ali. A noção de cinema de Reeves, que já era muito evidente desde sua experiência Cloverfield e mesmo nos ultra comerciais Planeta dos Macacos que dirigiu da nova franquia, é inegável e impressiona em cada sequência de Batman, mesmo que a forma não seja suficiente para reparar o roteiro manco e a sensação de tempo dilatado. É fato que ser fã do personagem ajuda a ver muita coisa positiva, pois traços instigantes naquele que está por trás da máscara ganham uma atenção especial aqui e isso traz outros atrativos à experiência. É um filme que, apesar de todos os seus tropeços e exageros, tem algum contexto e, por isso, consegue ir além dos tradicionais filmes de quadrinhos que dominam as salas de exibição e as bilheterias da atualidade.
Um grande momento
De cabeça para baixo