- Gênero: Documentário
- Direção: Alexander Nanau
- Roteiro: Alexander Nanau, Antoaneta Opris
- Duração: 109 minutos
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Em 30 de outubro de 2015, 27 pessoas perderam a vida após um incêndio na boate Colectiv, em Bucareste, capital da Romênia, com mais 39 mortes posteriores. O local estava com a capacidade acima do permitido, não contava com saídas de emergência e usava material inflamável em seu isolamento acústico. A tragédia romena lembra outras duas causadas pelo mesmo descaso com a segurança: em 2004, a da boate República de Cromañón, em Buenos Aires, com 194 mortos; e, em 2013, a da boate Kiss, em Santa Maria (RS), que matou 242 pessoas. Todos os três eventos causaram comoção e manifestações contra a corrupção que permitiu a manutenção das atividades dos locais, o que causou, na Romênia, a renúncia do primeiro-ministro Victor Ponta; na Argentina, a destituição do chefe do governo Aníbal Ibarra; e, no Brasil – pra variar – com a nomeação do prefeito da cidade gaúcha, Cezar Schirmer, no cargo de Secretário de Segurança do estado.
Apesar da renúncia, o documentário Colectiv vai além das informações divulgadas pela imprensa na época e mostra que a proximidade com o Brasil é maior do que aparenta. A Romênia é considerada, ainda hoje, um dos países mais corruptos da Europa. Não são poucos os políticos investigados e até condenados por crimes que exercem cargos na administração – era o caso de Ponta – e também impera no país a conhecida filosofia “mas todo mundo faz”, herança dos anos Ceauşescu, mas tão bem conhecida por aqui.
O filme de Alexander Nanau traz cenas da tragédia e acompanha a apuração dos jornalistas da Gazeta Sporturilor, periódico esportivo que escancarou um dos maiores esquemas do país, envolvendo toda a rede hospitalar, o governo e uma empresa química. Recuperando a participação nas entrevistas coletivas e acompanhando o dia a dia dentro da redação, não há muita originalidade no que se vê, mas a história contada é tão enojante e absurda que os olhos não desgrudam da tela, talvez esperando por algo que sabemos que não virá.
Além da rotina dos repórteres, o filme acrescenta reuniões com vítimas e parentes de vítimas, e elege personagens para acompanhar. As marcas na alma de um, pela perda, são físicas em uma das sobreviventes. Ainda que sejam participações relevantes para a humanização da história contada, as inserções não são tão bem executadas, provocando uma quebra no ritmo e uma incoerência com o tom investigativo que domina o filme. O mesmo estranhamento não é sentido quando Nanau, que assimila fatos à medida que eles acontecem, mergulha numa trama mais política, com a nomeação de Petre Toba como ministro de interior após a renúncia do cargo por Gabriel Oprea.
É como se toda a parte político-investigativa não conseguisse se conectar com as intenções mais sentimentais do filme, embora compreenda-se a intenção do realizador. O que Colectiv escancara, com a falência do sistema de saúde, o descaso de autoridades e médicos, mortes suspeitas, uma imprensa que só se manifesta depois que algum veículo tem a coragem de falar e as ameaças é assustador.
Claro que talvez seja mais para aqueles que moram em países que não sejam o Brasil. Porque aqui, além de ter tudo isso, a certeza de impunidade é ainda maior. Estão aí o número de mortos com a maior pandemia dos últimos anos, a propaganda governamental de um remédio que não tem sua eficácia comprovada e a impressão de que nada está acontecendo para provar. Se bobear, assim como o prefeito citado, o responsável ainda será premiado com mais anos na cadeira que ocupa.
Um grande momento
“Nós não somos mais humanos”.
[25° É Tudo Verdade – Festival Internacional de Documentário]