- Gênero: Ficção
- Direção: Josefin Malmén, David Strindberg
- Roteiro: Josefin Malmén, David Strindberg
- Elenco: Calle Bolund
- Duração: 4 minutos
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A paixão pela própria imagem acompanha a história da humanidade, está lá na Beócia, quando nasce o filho de Cefiso e Liríope e morre depois de ver sua imagem refletida nas águas; e está nas telas de milhares de celulares em trilhares de selfies tiradas no mundo inteiro e postadas em busca de exposição e likes. Está também há décadas na academias e em seus espelhos. É aqui que Josefin Malmén e David Strindberg colocam sua criatura, meio deus grego, meio humano exibicionista.
O tempo é impreciso, mas muito da direção de arte posiciona aquilo que se vê no passado recente. Ainda que moderno, é algo entre as duas realidades, como se a confirmação do mito fosse perpétua — sabemos que é — e o ontem fosse sempre uma preparação para o hoje. Vamos excluir aqui questões psicológicas e patologias, já que Flex é uma comédia e não tem a pretensão de abordar o narcisismo para além de sua conotação mais superficial.
O ser do filme é o fisiculturista sueco Calle Bolund. Em sua sunguinha verde metálica, vai alternando poses que destacam seus músculos. Uma voz em off chega como o fluxo de consciência daquele homem que se adora e deseja, que enxerga em seu reflexo toda a sua perfeição. A câmera passeia por seu corpo acompanhando seus devaneios apaixonados e explora aquele corpo, sendo os olhos do espectador. Vem a ruptura de percepção.
A imagem que seus olhos veem no espelho nunca será a imagem que outros olhos terão de você olhando sua imagem no espelho. Dois corpos, duas realidades, duas concepções ressignificadas pelas mesmas palavras (por isso essa repetição no texto). Assim Narciso deitou no rio e definhou, se matou depois de provocar o suicídio de um jovem, ou se apaixonou pela irmã gêmea, entre tantas outras versões. Enquanto o que ele via era uma coisa para ele, sua imagem era um monte de outras coisas para quem o observava.
E o que vem disso para o hoje? Flex parece específico, mas é genérico. Fala — e muito — das muitas horas gastas nos mergulhos em redes sociais especializadas em imagens, com textos que fogem do propósito e da imagem. Um espiral sem fim em uma espécie de competição por quem ganha mais corações, como prova de reconhecimento, ou de aproximação com a divindade do texto de Malmén e Strindberg. E num grande conflito de olhares: o olhar para si e o olhar para o olhar do outro.
É tanta loucura associativa e disruptiva, um mergulho semiótico tão intenso que só o caos dos signos para acompanhar a trilha do filme, e ele se entrega ao experimentalismo na representação do delírio de nosso homem-deus. Mesmo que Flex feche esse ciclo, deixando literalmente os pensamentos fugindo da tela, outros muitos estão abertos por aí. Tudo em quatro minutos.
Um grande momento
Vendo passarinhos