Crítica | Festival

Huda’s Salon

(Huda's Salon, EGY, NED, PAL, 2021)
Nota  
  • Gênero: Suspense
  • Direção: Hany Abu-Assad
  • Roteiro: Hany Abu-Assad
  • Elenco: Manal Awad, Ali Suliman, Maisa Abd Elhadi, Omar Abu Amer, Samer Bisharat, Kamel El Basha
  • Duração: 91 minutos

Huda’s Salon começa com a protagonista Reem (Maisa Abd Elhadi) lavando o cabelo no salão do título, enquanto tem uma conversa (nada sutil) sobre se expor demais no Facebook. Em questão de minutos, ela é drogada pela cabeleireira Huda (Manal Awad), que tira sua roupa, coloca-a numa cama ao lado de um homem nu e tira várias fotos. E pronto: se Reem não se tornar uma informante do Serviço Secreto israelense, que ocupa há anos a região da Cisjordânia, as fotos serão divulgadas, e a reputação dela estará destruída.

Isso são apenas os primeiros minutos do longa, que o diretor Hany Abu-Assad filma em planos únicos, como o que a situação realmente é: uma grande encenação, um pequeno teatro do absurdo que vira a vida da protagonista do avesso. Baseada em fatos reais, porém, a trama ainda conta com algumas reviravoltas que fazem do filme algo em que o cineasta tem se especializado desde Paradise Now, que lhe rendeu uma indicação ao Oscar em 2006: um estudo do complexo conflito entre Palestina e Israel utilizando ferramentas de gênero, especialmente do thriller e suspense.

Huda’s Salon não é tão bem amarrado e coeso, mas ainda assim consegue manter a tensão e a atenção do espectador durante seus enxutos 90 minutos de projeção. O longa se estrutura, basicamente, em dois eixos narrativos: o desespero de Reem, tentando lidar com a situação e entender como sobreviver com um alvo no meio de sua testa, enquanto cuida da filha recém-nascida e do marido ciumento; e Huda, que tem ela mesma algumas surpresas e é obrigada a confrontar o horror e a imoralidade de seus atos.

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Huda's Salon
Cortesia Seminci

Esse último é uma espécie de dispositivo brechtiano usado por Abu-Assad para discutir os crimes e a falta de escrúpulos dos dois lados do conflito palestino, que eventualmente se torna cansativo e repetitivo, com atuações teatrais e exageradas. As melhores cenas do filme são as que seguem Reem, que se torna uma espécie de repaginação do clássico protagonista hitchcockiano: uma falsa culpada, perseguida injustamente, completamente despreparada para enfrentar o inferno que se abate sobre ela. O diretor encontra algumas soluções sutis e eficazes para representar cinematograficamente a situação da protagonista, seja usando as arestas de uma janela como uma cruz atrás dela no consultório de um médico, ou o barulho de uma máquina de lavar como o tiquetaque do relógio letal contra o qual ela está lutando.

Só que, em vez da fobia de polícia do mestre do suspense, a protagonista sofre simplesmente a infelicidade de ser uma mulher na Palestina – ou seja, perseguida, desacreditada e paranoica apenas por ser quem é. Um dos aspectos mais interessantes de Huda’s Salon, que o distingue dos trabalhos anteriores do cineasta, é como ele tenta tocar na misoginia latente da região, a falta de direitos e liberdade das mulheres palestinas – e de que forma isso afeta o conflito com Israel.

Caso se aprofundasse um pouco mais nisso, o longa seria ainda mais interessante. Abu-Assad opta, porém, por uma abordagem seca e direta, que entra e sai da história sem muita cerimônia, com um fim que nega qualquer resposta ou conciliação para um conflito que permanece sem solução. Não é perfeito, nem sempre satisfatório, mas talvez até isso seja coerente.

Um grande momento
Toda a sequência inicial, da armação de Huda para cima de Reem

O crítico viajou a convite da 66ª Semana Internacional de Cine de Valladolid

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Daniel Oliveira

Daniel Oliveira é mestrando em Cinema pela Universidade da Beira Interior e crítico autoexilado, filiado à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e à Fipresci. Aguarda ansiosamente o meteoro, ou o reboot da civilização dirigido por alguém que não seja homem, branco e/ou hétero.
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