Crítica | Cinema

Missão de Sobrevivência

Vazio ultrapassado e desnecessário

(Kandahar, EUA, KSA, 2023)
Nota  
  • Gênero: Ação
  • Direção: Ric Roman Waugh
  • Roteiro: Mitchell LaFortune
  • Elenco: Gerard Butler, Navid Negahban, Ali Fazal, Bahador Foladi, Olivia-Mai Barrett
  • Duração: 119 minutos

Os primeiros momentos de Missão de Sobrevivência deixam a impressão de que o longa vai ser mais um thriller de espionagem, com uma premissa regular se esta conseguisse se sustentar. Porém, não demora para que o filme dirigido pelo ex-dublê Ric Roman Waugh (de O Acordo e Destruição Final) se transforme em mais uma produção de ação vazia, daquelas que são produzidas aos montes pelo cinema estadunidense e que não deixam qualquer marca no espectador. Com roteiro de Mitchell LaFortune, o longa vai buscar no Oriente Médio antigos conflitos e velhos vilões; tenta filosofar com obviedades sobre a guerra e aposta na ansiedade da perseguição e do resgate.

A história começa com o agente Tom Harris, emprestado da MI-6, finalizando uma missão como infiltrado no Irã. Disfarçado de técnico de informática, ele precisa invadir o sistema de uma instalação nuclear secreta para que os Estados Unidos a destruam a distância (“só americanos e israelenses conseguem fazer isso”, diz um personagem iraniano sobre o ocorrido). Por outro lado, toda a operação está sendo monitorada por outros espiões interessados em divulgar as táticas do Pentágono a uma jornalista que, capturada pelo serviço secreto do Irã, acaba expondo a primeira operação. A identidade de Tom, que já havia sido convencido a começar um novo trabalho, é descoberta e sua cabeça é posta a prêmio.

Entre escutas telefônicas e capturas de imagens de drones e câmeras de segurança nos lugares por onde passa, além da comunicação por todo tipo de aparelho, a trama intrincada tinha tudo para ser um bom filme de espionagem, mas falta habilidade para lidar com as informações, e nem se considera dar algum tempo a elas. Waugh tem a ansiedade de tratar a maioria das passagens como se fossem cenas de tiroteio e perseguição, o que prejudica qualquer desenvolvimento de um plot mais sério e que vá além do jogo de gato e rato que se estabelece em seguida.

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Como se alguém não soubesse disso, há ainda a intenção atrapalhada de falar que todos são iguais, que ninguém está com as mãos limpas em uma guerra. Porém, o filme não deixa de divulgar todos os estereótipos para que as coisas se mantenham exatamente como estão. Irã, Afeganistão e Paquistão; Talibã e Estado Islâmico; Missão de Sobrevivência quer cuidar de tudo e, por Alá, como é antiquado na maneira como aborda e constrói suas interações. Os personagens são rasteiros e, quando assumem a função crítica do longa, caem na caricatura. O maior exemplo é o espião paquistanês Kahil Nasir com seus discursos contemporâneos ou sobre o Corão.

Tudo dá errado e é atrapalhado, mas tem coisas que se sustentam no filme. Com uma câmera nervosa que nem sempre se justifica no princípio, o diretor de fotografia MacGregor, responsável por bons trabalhos como A Queda e Viveiro, sabe como criar bons quadros no deserto e dar ritmo à frenética perseguição que toma conta do filme. Waugh também acerta no ritmo dessas passagens, manipulando bem a suspensão e elaborando boas sequências de ação. A parceria com Gerard Butler – já é a terceira produção que os dois fazem juntos – traz uma intimidade que facilita o trabalho e, mesmo que o material não careça de muita elaboração, ajuda na conexão com o protagonista.

Comprovação do que é evidente, Missão de Sobrevivência segue reafirmando valores estereotipados e preconceituosos, se sente bem ao exaltar o poder bélico e apenas repete aquilo que não precisava mais ser exaustivamente produzido. É cafona no conteúdo e, como se isso não fosse o bastante, não consegue nem mesmo seguir suas próprias intenções. Tem uma boa cena aqui e outra ali, mas é isso. Seu conjunto é vazio. Em tempos de Barbie, é um refúgio seguro para aqueles que estão se sentindo ameaçados e não estão dispostos a pensar com Oppenheimer.

Um grande momento
Por fora do engarrafamento

Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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