Crítica | Festival

Os Irmãos de Leila

Gilberto Braga vai ao Irã

(برادران لیلا, IRÃ, 2022)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Saeed Roustayi
  • Roteiro: Saeed Roustayi
  • Elenco: Taraneh Alidoosti, Saeed Poursamimi, Navid Mohammadzadeh, Payman Maadi, Farhad Aslani, Mohammad Ali Mohammadi, Nayereh Farahani, Mehdi Hosseinina
  • Duração: 165 minutos

Mais um título oriundo do Irã foi apreciado nesta 46a. Mostra SP, e fica cada vez mais claro como o cinema de Asghar Farhadi influenciou seus conterrâneos a tal ponto que nem parecem mais minimamente com qualquer coisa que ele faça. A ideia parece que foi diluída em uma intenção bizarra, de ‘fazer maior e melhor’, parecem essas promessas de discurso de campanha política; na hora H, tanto exagero desanda, ou só era superestimado mesmo. Os Irmãos de Leila competiu no Festival de Cannes desse ano, de onde saiu com um bizarro prêmio FIPRESCI, da associação de críticos no evento. Digo bizarro porque o título não poderia ter uma vocação mais popular, o oposto das escolhas da crítica, muito mais próximo do que costuma fazer o júri oficial, por isso a falta de compreensão. 

Com inacreditáveis 2 horas e 45 minutos de duração, Os Irmãos de Leila consegue o feito extraordinário de ter a exata duração que precisaria ter, e ao mesmo tempo nos fazer perguntar por que tanto tempo ficamos dentro de uma sala de projeção para assistir ao filme. A explicação já foi dada em alguns dos títulos iranianos que escrevi durante a Mostra (ou ao menos pensei ter escrito; preciso ter argumentos diferentes, né?), que é a tradição melodramática das narrativas do país, que os fazem facilmente serem confundidos com uma telenovela. Enquanto tal, a trama do filme – rocambolesca até a medula – contada nessa duração, poderia com tranquilidade estar sendo exibida às 21:00 na Globo por seis meses; tinha premissa suficiente pra isso e muito mais. 

Os Irmãos de Leila
Amirhossein Shojaei

Isso não é um sinal negativo para o filme, a priori. De comunicação fácil com qualquer público, Os Irmãos de Leila, assim como Terceira Guerra Mundial, é mais um dos casos de títulos iranianos que funcionam tão completamente em seu roteiro, que fica difícil encontrar argumentos para colocar a exposição do que faço. O problema aqui é como cada um desses 117 ganchos e plots do filme se apresentam, e de como o filme se coloca nessa situação. Saeed Roustayi, apesar dos parcos 33 anos, já tem experiência cinematográfica tanto como diretor quanto como roteirista, e tem consciência do que está exibindo. O envolvimento emocional é fácil, mas tudo está sempre no fio da navalha do bom gosto, resvalando sempre que pode em um certo grau de incômodo. 

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Esse incômodo advém, entre outras coisas, da forma como os personagens parecem sempre muito desesperados, descontrolados, estressados, batendo boca, em situações extremadas com frequência. Então é compreensível que uma certa ala da cinefilia compre a evolução narrativa, que ninguém pode negar ser carregado de sedução. Como há uma clara exacerbação de diálogos, na entonação do que é dito, na quantidade de vezes que é dito, na insistência com que cada intencionalidade é sublinhada, dita, e repetida a cada cena; soa cansativo e desnecessário na maior parte das vezes. Não há uma trajetória de sutileza que ao menos seja oposição a uma cena ou outra; Os Irmãos de Leila é um filme que pode ser definido como insistente, até que se prove um ponto. 

Os Irmãos de Leila
Cortesia Mostra SP

A cena do casamento é emblemática dos problemas do filme, que não o demolem, mas que não justificam um abraço mais relaxado. A cena é o ápice da produção, e gira em torno dela grande parte do que é debatido no filme, de maneira direta. Dois momentos demonstram os excessos da cena (e do filme); o primeiro quando Ali vai conversar com seu primo e fazer um pedido, e isso é remexido durante mais tempo do que parecia razoável, e o segundo quando a farsa cai durante a festa, e o ator Saeed Poursamimi é filmado de maneira pornográfica por um roteiro que o trata como um vilão de produção mexicana para tv. As notas de tudo são tão agudas nessa cena, ao mesmo tempo em que faz sentido esse filme com essa narrativa ter essa decisão final.

Com um elenco robusto onde se destacam Taraneh Alidoosti (de O Apartamento) e Navid Mohammadzadeh (de Além das Paredes), além do já citado Poursamimi, Os Irmãos de Leila é mais uma garantia do alcance do Irã enquanto potência de cinema. O público também já se rendeu a uma ideia mais facilitada de encontrar uma saída para longe do que é mais seguro. Falta encontrar um equilíbrio onde todas as vertentes sejam a favor do bom cinema, e não apenas do mais popular e acessível. 

Um grande momento
A passagem final; enfim, uma sutileza

[46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo]

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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