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Terapia do Medo

Hipnose de choque

(Terapia do Medo, BRA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Terror
  • Direção: Roberto Moreira
  • Roteiro: Roberto Moreira, Luciano Patrick
  • Elenco: Cleo, Sergio Guizé, Kiko Bertholini, Luma Oquendo, Andressa Cabral, Lourenço Metri, Valentina Safatle
  • Duração: 84 minutos

Custa a ficar claro que o talentoso Roberto Moreira, merecidamente premiado por Contra Todos, tenha chegado ao ponto de cometer algo tão raso como Terapia do Medo, que acaba de chegar à Netflix. Utilizando o surgimento da mediunidade em alguém de uma maneira tão simplista, para não dizer irresponsável, o filme parte de ideia de cinema de gênero. Produção que se comunica com o fantástico e poderia abrir novas portas de entrada para tal campo na nossa cinematografia, a produção não consegue acertar em suas escolhas, desrespeitando uma prática séria e compenetrada, ainda que seu plot twist final tenha um tempero que pode ser discutido, infelizmente abortado sem propor uma elaboração.

Com uma ideia que poderia ser desdobrada de maneira adequada por outro roteiro que não esse escrito por Moreira e Luciano Patrick, o filme acompanha as gêmeas Clara e Fernanda, campeãs de vôlei de praia que estão passando por um momento difícil na carreira desde que Clara começou a se consultar com o médico Bruno por conta de transes e ausências que vem tendo. Após um acidente a deixar catatônica, sua irmã e seu médico precisam se unir para tentar recobrar sua consciência com métodos arriscados, que podem trazer Clara de volta. Essa premissa é desenvolvida com alguma pressa (a duração não chega a 80 minutos) e o filme se entende como uma produção para consumo rápido, sem maiores reflexões.

Essa afobação e seu desenvolvimento menos hiperbólico do que entendemos como cartilha de thriller não se comunicam e o filme, que poderia ser mais raso se queria apenas servir como passatempo sem compromisso, ou mais elaborado pelo que acaba apresentando enquanto discussão moral, acaba ficando em um meio termo ingrato que não agrada ninguém, já que seu ritmo precisaria ser mais ágil para um grupo e seu roteiro precisaria ter mais saídas dramáticas de outro. Da forma como é entregue, Terapia do Medo fica em um incômodo meio do caminho entre agradar gregos e troianos, sempre a pior escolha.

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Terapia do Medo
Foto: Reprodução

A trilha sonora onipresente de Terapia do Medo é quase um personagem à parte na estrutura da produção, mas sua ideia de condução pelas emoções da trama é muito intrusivo. A cargo do experiente Alexandre Guerra (de O Tempo e o Vento), sua intromissão sempre aguda tira qualquer possibilidade de sutileza das cenas, tendo em vista que ela conduz todas as ações, não apenas pautando os acontecimentos como antecipando-os, tirando do espectador o direito de criar o próprio desenho sonoro intuitivamente. Esse erro é comum em produtos de gênero que não acreditam nas imagens que foram criadas para contar sua história e isso é claro aqui.

Com uma baita responsabilidade nas mãos, Cleo (de Operações Especiais) não chega a ser um desastre em cena, como muitos querem apregoar. Ainda assim, para se credenciar ao posto complexo de encarar gêmeas em cena, você tem que encontrar um manancial de recursos técnicos e emocionais que a atriz não possui; não é qualquer uma que consegue se desdobrar em Ruth e Raquel com perfeição, isso é trabalho só para Glória Pires mesmo (ops!). Mas a produção não a ajuda em nada, e nem o filme nem a atriz criam nuances suficientes para diferenciar suas personagens, e isso é fatal em uma produção que aborde a relação entre duplos.

O que acaba chamando atenção em Terapia do Medo, além da possibilidade de ampliar a produção material de gênero no país, é a utilização de efeitos práticos, na maioria das vezes de bom gosto e muito funcionais. Isso poderia ser algo menor em qualquer outro filme, mas em uma produção que se pretende reconhecer dentro do fantástico, seu capricho no acabamento de algumas soluções visuais é muito bem-vindo e ajuda ao longa de Moreira contar uma história que termina de uma maneira que quem acompanha slasher dos anos 1980 vai reconhecer a referência, e os demais podem apenas se apegar a uma produção que pode abrir caminho para outras.

Um grande momento
O acidente de moto

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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