Crítica | Outras metragens

Andrômeda

Os dias sem

(Andrômeda , BRA, 2022)
Nota  
  • Gênero: Drama
  • Direção: Lucas Gesser
  • Roteiro: Lucas Gesser
  • Elenco: Bruna Martini, Gabriela Correa, Dinna Lourrany
  • Duração: 14 minutos

Um fim nunca é fácil. Olhar para os lados e perceber que aquela pessoa ao seu lado não está mais, não é fácil. Se já não é fácil sair de um relacionamento por nossa escolha, contra ela é ainda mais complexo. A sensação de vazio, de desamparo e solidão é inevitável. Esse é o lugar que quer ocupar Andrômeda, curta de ficção que esteve na competição do Cine PE 2022, a visão sobre uma perda – não importa se recente ou não, o que importa é a ausência ainda presente – que não pode ser substituída por coisa alguma. O que fica é o buraco sendo observado, uma dilaceração interna que não há costura possível; invisível e ao mesmo tempo tátil.

O diretor e roteirista Lucas Gesser, como todos nós, já deve ter passado por esse momento onde a não-existência parece nos chamar. Estamos sem querer estar, e a tradução disso em imagens é feita com a exatidão de quem já viveu isso. Essa busca incessante por algo que não se sabe o que é, um significado, uma resposta sincera para algo que não se encontra explicação. Julia é provavelmente a parte que não queria estar solteira, mas sabemos que o fim é doloroso mesmo quando o desejamos. Essa ausência que vemos em Andrômeda, então, nos leva a que parte da psicologia humana? E o quanto disso é possível de representação imagética?

Enquanto curta-metragem, o filme não encontra um momento largo da existência. É um recorte fugaz do tempo, que já não está mais sendo vivido; somos testemunhas dos dias, dos movimentos. Por isso funciona, o que em duração superior encontraria um vácuo de interesse. Aqui, Gesser sabe perceber que seu recorte não carece de informações adicionais maiores ou profundas; nosso entendimento daquela dor nos coloca em partilha empática. Andrômeda mostra esses momentos imediatamente posteriores ao término, e como essa ausência de sentido promove delírios que, prostrados, não percebemos o impulso adiante de tais eventos. 

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É um filme cuja melancolia acaba por afastá-lo de lugares óbvios, como (500) Dias com Ela e Ela, por estar ainda mais interiorizado que esses. Julia não está em órbita conhecida, seu rosto e corpo procuram nas galáxias mortas uma ideia de reconstrução, ou de um brilho que só vive na altura da retina e/ou lembranças. Quando estamos tão eletricamente focados em um ponto específico (no caso, a perda), e a solução para a dor do fim é a recordação, faremos de tudo para aplacar esse sentimento. A saída é a fuga do real para o imaginário, para um lugar onde possamos imaginar um novo fim, uma nova verdade, ao menos uma que seja repleta de coisas que não existem mais, que não de maneira fantasmagórica. 

Enquanto perambula por uma cidade tão esvaziada quanto si mesma, Julia nos carrega para esse horror emocional que a tragou, tentando se refugiar em um passado sem concretude. Andrômeda é sobre esse vagar indiscriminado por um interior cheio de fúria calada, uma vontade absurda de correr e fugir. Mas, apesar das recordações ainda brilharem cheias de vida inexistente, a vida clama por reação. Ela pode estar na fresta de uma amizade, nos números oficiais de um jogo antigo ou no espaço sideral; o refúgio é importante, mas a volta para a realidade insiste em nos fazer acordar. A montagem de Rafael Lobo faz com que o filme de Gesser pulse para além dos sonhos. 

Um grande momento

Andrômeda

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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