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Cinderela

A história agora é outra

(Cinderella-, EUA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Musical
  • Direção: Kay Cannon
  • Roteiro: Kay Cannon
  • Elenco: Camila Cabello, Nicholas Galitzine, Idina Menzel, Pierce Brosnan, Minnie Driver, Tallulah Greive, Billy Porter, Maddie Baillio, Charlotte Spencer, James Corden, James Acaster, Romesh Ranganathan, Rob Beckett
  • Duração: 113 minutos

Se o espaço, e mais importante, o destaque foi dado para o contexto, vamos agora ao filme. O que é Cinderela além de toda essa maravilhosa desconstrução de um símbolo negativo? Bom, o lançamento da Amazon e iniciativa arriscada da Sony de bater de frente com a Disney tem qualidades técnicas, mas tem muitos problemas. E podemos começar pelo elenco. Embora Cabello encaixe na Ella dos novos tempos, falta muito no quesito atuação e o mesmo se pode dizer de seu parceiro de cena Nicholas Galitzine (Jovens Bruxas), ainda melhor do que ela. Para além deles, são poucas as atuações que se destacam. Idina Menzel, como a madrasta; Charlotte Spencer como Narissa, e Jenet Le Lacheur, como Wibur, são algumas delas.

Houve uma dedicação para que o filme fosse divertido, isso fica bem claro e essa também parece ter sido a ordem no set. A sensação não deixa o longa e justifica que o elenco esteja mais superficial do que o usual. Não que não funcione para o seu objetivo de consumo rápido, mas se lamenta aquilo que poderia ter sido melhor. Ainda assim, algumas participações valem a pena, como James Corden. O ator britânico, que está em 98% dos musicais lançados no cinema estadunidense, é sempre uma presença marcante e, aqui, define bem esse sentimento de deslocamento dos personagens em prol da diversão.

E aproveitando que falamos de Corden, vale entrarmos na seara das interpretações musicais. Por que não contratar atores de musical para cantar? É até compreensível — não indicado, mas compreensível — uma cantora da moda para o papel principal, mas por que ignorar que existem pessoas especializadas em atuar e cantar (e como estamos falando dos Estados Unidos faz ainda menos sentido) para o papel do príncipe? Uma coisa é você fazer um Mamma Mia!, onde faz parte do conceito do filme não ter atores-cantores, outra, completamente diferente, é você fazer esse Cinderela, onde há papéis para atores e papéis para atores-cantores e se mistura tudo sem nenhum sentido.

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A produção, como dito antes, é muito detalhista e vistosa. Além da diferenciação das cores para destacar Cinderela de todos e do espaço que a cerca, há uma atenção ao reino. O castelo e a casa da madrasta são cheios de pequenos detalhes que chamam a atenção. O desenho de produção de Paul Kirby, que já tinha assinado produções elaboradas como Kingsman: Serviço Secreto e o novo Hellboboy, também usa a arte para fazer a distinção de classes, um outro ponto contextual forte do longa. Depois de anos fazendo assistência de cenografia, com um filmografia que inclui Ex_Machina, O Caçador e a Rainha de Gelo, A Múmia e Malévola: Dona do Mal, Kathryn Pyle assume o posto de cenógrafa e faz um trabalho digno de elogios. O mesmo pode ser dito dos figurinos de Ellen Mirojnick. Há um quê de inovação que se apoia num falso clássico, mas combina tanto com a criatividade que a profissão dos sonhos de Ella pede como com a mudança que o filme estabelece.

Também já abordada, a trilha sonora faz o mesmo ao trazer o moderno e o pop ao que se associa tradicionalmente a contos de fadas com príncipes e encantamentos. A integração de um coro cantado para transmitir os anúncios reais em músicas que incorporam o hip hop, numa tendência que Lin Manuel Miranda popularizou nos musicais, é muito boa e há uma passagem específica, que vai além de melodias, é mais mis-en-scène, que traduz a alma dessa renovação: a da violoncelista.

Assim, o que se pode dizer desse novo Cinderela, enquanto cinema, é que ele é um filme bastante irregular, com muitos pontos positivos, mas com defeitos que, sem dúvidas, trazem problemas ao desenvolvimento da trama. Não fosse a mensagem tão importante e a coragem de romper com algo sólido e arraigado em nossa cultura, talvez passasse batido e fosse apenas alvo de críticas ferrenhas. Porém, é preciso muita alienação e falta de sensibilidade para não perceber tudo de positivo que o filme traz. São primeiros passos e eles podem vir assim descompassados, com vozes tortas, atuações esquisitas e falhas por todo lado, mas têm, sim, muitas coisas boas, além de divertirem bastante e o mais importante de tudo: são passos que foram dados.

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Cecilia Barroso

Cecilia Barroso é jornalista cultural e crítica de cinema. Mãe do Digo e da Dani, essa tricolor das Laranjeiras convive desde muito cedo com a sétima arte, e tem influências, familiares ou não, dos mais diversos gêneros e escolas. É votante internacional do Globo de Ouro e faz parte da Abraccine – Associação Brasileira de Críticos de Cinema, Critics Choice Association, OFCS – Online Film Critics Society e das Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema.
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