Documentário
Direção: Cristiano Burlan
Roteiro: Cristiano Burlan, Ana Carolina Marinho
Duração: 93 min.
Nota: 7
Com Elegia de um Crime, Cristiano Burlan conclui sua Trilogia do Luto e traz às telas a dor de uma família marcada pela perda e a violência. Antes da conclusão, com Construção (2007), o diretor mergulhou em canteiros de obras da megalópole São Paulo para lembrar a morte do pai; em Mataram Meu Irmão (2013) voltou-se à morte de um de seus irmãos quando no Capão Redondo, um dos bairros mais violentos da capital paulista, em uma investigação sobre a vida e a violência urbana.
A morte que encerra a trilogia é a da mãe de Burlan, assassinada em casa por seu companheiro. O documentário investiga o paradeiro do feminicida e mescla memórias com a busca pessoal por justiça. Entre a cura e a denúncia, o diretor consegue, mais uma vez, universalizar uma dor extremamente pessoal. Para compor sua trama, ele parte da própria memória e, ao narrar suas lembranças, encarrega-se da ligação imediata com o público.
Burlan usa palavras para traçar o seu caminho, mas aposta na literalidade das imagens para fortalecer sua narrativa. O que primeiro se vê ao ouvir suas palavras é uma estrada, ainda sem vislumbre de qualquer final. O seguir caminhando em busca de algo e, ao mesmo tempo, afastar-se daquilo que, como uma âncora, não permite prosseguir.
O retrato familiar daquela mulher é traçado pela própria família. Filhos, mãe, irmã, cunhado discorrem sobre o que havia de marcante naquela mulher e suas memórias ganham identificação em antigas fotografias. O filme está sempre entre a reverência e o exorcismo da dor. Como se no lembrar, fosse possível amenizar a ausência, mas este mesmo lembrar trouxesse uma outra dor, a da impunidade.
Pois, por trás de todas a dores, está a revolta pela forma como se deu a ausência. Algo que está muito bem determinado na segunda parte do filme, quando as atenções se voltam à tentativa de localização do assassino. Burlan acessa uma outra realidade diversa, buscando a repórter sensacionalista que noticiou o crime, entrando em contato com policiais e expondo sua busca individual no assentamento onde o criminoso havia sido visto.
Elegia de um Crime parte de um lugar emocional, sem determinações físicas, e vai se construindo entre espera e ação, mudança e manutenção, verdades e revelações, e está, o tempo todo, carregado de muitos sentimentos. Fortes, intensos e infinitos.
Neste distinto caminhar, acerta em vários pontos: na habilidade com que o diretor mescla narrativamente resgate e busca pela justiça; na verdade com que acessa vários sentimentos muito particulares – seus e de outros – e, ao mesmo, os compartilha com o público; na universalização daquela história que é deles, mas que foi e ainda é a de tantas outras mulheres, de tantas outras famílias no Brasil e no mundo.
Um Grande Momento:
A girafa rosa.
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Texto originalmente publicado na revista Lume Scope