- Gênero: Animação
- Direção: Kirk DeMicco, Faryn Pearl
- Roteiro: Pam Brady, Brian C. Brown, Elliott DiGuiseppi
- Duração: 85 minutos
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O que mais chama atenção em Ruby Marinho, Monstro Adolescente é o fato dessa história em particular estar na zona da animação, porque entre os live-actions esse “acerto de contas” entre mães e filhas já rendeu inúmeras produções. Mesmo entre as animações, Red já tratou disso, de alguma forma, no ano passado. Mas é exatamente pelo fato de ser uma narrativa animada que cria o escopo ideal para esse filme criar uma individualidade em meio a conflitos de gerações. Pais e filhos já tiveram toda a história do cinema para desenvolver essa questão; com o avanço do olhar sobre o feminino, sobre as questões que uma mulher teria (e que não fossem apenas ser conquistada por alguém), as muitas mais ricas problemáticas entre mãe e filha vem ganhando espaço, e realizando suas metáforas de diferentes modos.
Dirigido por Kirk DeMicco (de Os Croods e A Jornada de Vivo) e Faryn Pearl, Ruby Marinho, Monstro Adolescente é uma história tradicional sobre o início da puberdade, mas igualmente sobre sororidade e mais do que sobre empoderar-se, mas sobre como esse empoderamento não somente é decisivo, como também utilitário. Creio que a figura de Pearl tenha sido preponderante ao lado de DeMicco para instituir o que era evidente nessas vozes, o que é evidentemente humano no filme, e igualmente reger esse apanhado de vozes a fim de elevar todas, e não apenas uma delas. Lógico que, no meio dessa ideia, precisamos também desenvolver o que é fabular e apenas elegível enquanto história de ficção. Acima de tudo, o filme é um produto em larga escala, que precisa ser comprado pelo público independente de suas demandas autorais.
Temos uma heroína a princípio diletante, e um caso de percepção quanto aos papéis sociais que nossa família desempenha, no mundo e na nossa vida. Mãe e filha estão em embate, assim como já estiveram antes mãe e avó, mostrando que o ciclo desses laços de sangue nos propõe a repetição dos papéis, mesmo que muitas vezes não percebamos o caminho das águas se formando. Agatha não percebe de cara que a história com sua filha é um reflexo ao contrário do que fez 20 anos antes com a própria mãe; não aceitando seu destino, fugiu para construir uma história particular, quando sua filha quer justamente seguir o legado. Dizem por aí que os interesses de uma geração pulam sempre a geração seguinte, para voltar com força duas depois – Ruby Marinho, Monstro Adolescente escancara esse mito popular.
Outra situação que é deflagrada aqui na aventura é o papel secundário relegado aos homens, em todas as frentes. O pai de Ruby parece ter mais um hobby do que um emprego, seu irmão mais novo é um alívio cômico pontual, seu tio é uma figura sem importância na linhagem familiar, um dos seus amigos é só uma escada para o interesse romântico de outra, e o seu próprio interesse amoroso… não passa disso nunca. São figuras ou desprovidas de linhas gerais, ou como o tio arrancado de funções que ele gostaria de ter, não têm e está tudo bem. A figura bonachona do pai também deixa claro que Ruby Marinho, Monstro Adolescente chega em um tempo onde uma história pode sim ser capitaneada por mulheres, e ter tanta aventura e emoção para agradar qualquer gênero.
E é incrível que Ruby Marinho, Monstro Adolescente venha reafirmar o que já sabemos há mais de 30 anos e Hollywood não conseguiu dominar. Com a exceção de James Cameron, é melhor deixar as profundezas marinhas nas mãos exatas de um grupo de animadores. O colorido, as texturas e a fluência de eventos que ocorrem aqui ainda estão muito longe de ser absorvidas em materiais como os de Aquaman e Pantera Negra: Wakanda Para Sempre. A cidade que abriga a família que se disfarça de canadense (essa piada é muito boa) já é de uma profundidade de campo invejável, inclusive é mais rica em detalhes que o próprio fundo do mar, mas o que vemos ao mergulhar é tão fascinante que se torna impossível não rir nas tentativas de emular o que vemos aqui.
Com previsão de arrecadação muito inferior ao que merecia, Ruby Marinho, Monstro Adolescente está alinhado ao contemporâneo tematicamente, e sem querer, critica também a indústria, ao mostrar para eles qual o lugar onde o mar é mais azul. Esteticamente tem a exuberância que se pede a uma animação que queira chamar atenção no mercado competitivo de hoje, e sua história conversa com públicos de muitas idades diversas, porque o filme as representa de maneira acertada. Ainda tem a revelação de uma vilã deliciosa, astuta e manipuladora, que nos deixa com água na boca, representando tais figuras de uma maneira que nunca imaginamos. Pode reiterar a rivalidade entre mulheres? Até pode, mas também as coloca como donas absolutas da ação.
Um grande momento
Ruby diz ao motorista do ônibus de onde veio