Crítica | Streaming e VoD

Frangoelho e o Hamster das Trevas

Uma lebre diferente e sua charmosa tartaruga

(Hopper et le hamster des ténèbres, BEL, FRA, 2022)
Nota  
  • Gênero: Animação
  • Direção: Ben Stassen, Benjamin Mousquet
  • Roteiro: David Collard
  • Duração: 91 minutos

A Netflix continua sua tradição de lançar pelo menos uma animação forte por mês. Ops, esqueci das aspas em ‘forte’ – porque, muitas vezes, essa animação atende pelo nome de ‘Marmaduke’. No geral, o meio do caminho é a tradição, e esse novo ‘Frangoelho e o Hamster das Trevas’ está neste lugar. Mais uma produção original Sony Animation que o streaming pegou pra si, o filme tem uma mensagem batida, nada original, mas que sempre funciona. E a animação, essa sim, é muito bacana, com belos efeitos e muita aventura, além de um colorido que funciona bastante. Se colocamos essa estreia de hoje do lado de algumas produções que eles já entregaram anteriormente, o filme dá um salto fenomenal de qualidade e chega muito bem na fita para toda a família.

Produção francesa dirigida por Ben Stassen e Benjamin Mouquet a partir de uma ‘graphic novel’ de Chris Grine, o filme é mais uma animação que bebe na fonte do ‘Hamlet’ de Shakespeare, assim como tantas outras já o fizeram. Aqui, no entanto, os conceitos do ‘O Patinho Feio’ de Hans Christian Andersen, foram misturados para surgir uma premissa que deveria aparentar novidade, mas desistiu no caminho. Isso não é exatamente um problema, como já dito o filme funciona no que se propõe, seja narrativa ou estética, e caminha tranquilo para se tornar um agradável novo sucesso do canal, esse até merecido. Chega ao público com até um certo frescor, por trazer animais no centro da trama pouco utilizados no protagonismo infantil. 

O tal Frangoelho do título é, como o próprio nome já diz, uma estranha mistura de frango com coelho que foi adotado ainda bebê por um futuro rei de uma pequena ilha de animais. Hoje um adolescente, não encontra qualquer outro parecido consigo em sua terra – apenas frangos ou coelhos, o que faz com que sua figura tenha gerado bullying desde sempre. Seu sonho é se tornar o aventureiro que seu pai foi na juventude, um caçador de tesouros arqueológicos e perdidos. O filme também acerta ao evocar Indiana Jones a todo momento, colocando a aventura na espinha dorsal da narrativa, e vestindo seu personagem como o mítico arqueólogo vivido por Harrison Ford. Mas, como citei a obra do bardo inglês, obviamente existe um tio no meio do caminho querendo roubar o reino pra si, e tentará fazê-lo encontrando um artefato chamado Hamster das Trevas, que por si só daria a coroa a quem o encontrasse. 

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Frangoelho e o Hamster das Trevas
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O personagem do tio, o ardiloso Lapin, já fez do Scar de ‘O Rei Leão’ uma lenda adorada até pelas crianças. Aqui, é uma figura menos imponente e com menor charme, ainda que todo vilão o tenha. Igualmente poderia ser atribuído à gambá Meg maior relevância na trama, mas a única personagem feminina do filme também não sai da promessa. Além do Frangoelho em si, se tem alguém que rouba a cena da produção é Abe, a adorável tartaruga que é uma espécie de preceptor do jovem príncipe. Abe é um achado do roteiro e da animação, recheado de cinismo e com uma melancolia que mal disfarça seu bom humor. É o grande personagem do filme sem qualquer dúvida, dono das melhores tiradas e responsável pelas cenas mais marcantes da produção, que ainda bem o explora muito. Seu ator, Joe Ochman, realiza o mais notável trabalho em cena. 

‘Frangoelho e o Hamster das Trevas’ não demora a revelar sua mensagem, a de que precisamos aceitar as diferenças em nós, para perceber o que de especial nos foi legado. É daquelas mensagens imortais, que valerão pra sempre em qualquer situação de diminuição de nossas capacidades, independente de nossas características. Isso fez a fama de inúmeras animações e é a base de muitos títulos em live action inclusive, sinal de que é mesmo uma maneira universal para lidar com a aceitação das diferenças para crianças e adolescentes. No filme, um personagem que nasceu de maneira híbrida e precisa ser levado até o limite pra descobrir qualidades escondidas, é uma metáfora diária para o tanto de não-aceitação que sofremos, pela nossa cor, pela nossa sexualidade, pela nossa religião, pela nossa nacionalidade, ou seja, pelo que nos faz únicos, nossa mistura. 

De maneira bem humorada e colorida, o filme nunca deixa de entreter e apresenta um vilão especial na reta final, os tais hamsters unidos que são obsessivamente caçados, que são coisas simplesmente fofas demais; pena que o filme não se dedique mais à essa ambiguidade, de colocar criaturinhas tão bonitinhas para difundir o mal. Suas presenças em cena inclusive iluminam ‘Frangoelho e o Hamster das Trevas’, e junto com com Abe, fazem dessa estreia um motivo para ser visto, mesmo com potencial não inteiramente explorado.

Um grande momento
Frangoelho convence Abe à viajar

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Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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