Crítica | Festival

Diário dentro da Noite

Dias de arte

(Diário dentro da Noite, BRA, 2021)
Nota  
  • Gênero: Documentário
  • Direção: Chico Diaz
  • Roteiro: Chico Diaz
  • Duração: 65 minutos

Chico Diaz permitiu que a pandemia inspirasse seus instintos artísticos para inúmeros lados, não apenas como seu lado mais divulgado – o ator Chico Diaz, em suas várias vertentes. Aqui esse ator, Chico, está despido das vaidades de ator para encontrar suas vozes e verdades também como autor. Diário dentro da Noite, sua estreia que foi exibida na Mostra Tiradentes, é um olhar muito aguçado sobre os processos de cada artista para descobrir uma fatia de alcance dentro da própria arte, enquanto também se convenciona verbalizar sobre o nosso contemporâneo, política e socialmente.

O que acontece em cena se mistura entre contexto e celebração, é potencializado pela pandemia do COVID-19 que assolou o mundo, mas também é na elucubração das possibilidades tratadas por esse fator, que é possibilitado o ensaio onde Diaz revelam, com sutileza, suas molas propulsoras, em vida pessoal e na manutenção de sua arte. Nada é conversado explicitamente, apenas vemos o ator em processo de rememoração do espetáculo A Lua vem da Ásia, baseado na obra de Campos de Carvalho e que ele encenou por anos, enquanto tenta sobreviver a uma lockdown que poucos respeitaram, mas que ele claramente corroborou.

Entre declamações do texto em questão, apropriações do mesmo ante ao estado das coisas que nós vivemos e ele reproduz, e a tentativa de lidar com a solitude que fomos impostos pelo imponderável, Diaz descobre com suavidade um profissional capaz de interagir com o monólogo à distância (o longa é cinema e também guarda a força do teatro), mas também com a criação de imagens que sugerem uma outra demonstração de autoralidade, produzindo em seu espaço como artista plástico e interseccionando suas porções artísticas em todo o canto possível – ator, autor, diretor, pintor, múltiplo e único, como caiba em seu lugar.

Apoie o Cenas

São suas marcantes características que formam o campo de sutileza que esse artista encampa. Com os caminhos que ele passeia ao longo de pouco mais de 1 h de duração, nos perguntamos porque demorou tanto para Diaz explorar outros lados de sua completude como profissional da arte. Nada parece desconectado de uma realidade do próprio Diaz, nem do que constitui a narrativa do filme, que podemos até concluir que é muito ampla e repleta de curvas que poderiam ser entendidas como vagas, mas faz parte do universo de um homem que vive a arte em sua plenitude em toda a sua essência, e ele se traduz em cada nova passagem.

As inserções onde o filme se posiciona contra o governo genocida não precisam ser mais explicitadas que já são posicionadas, e Diaz se dedica a situar seu filme politicamente por outros caminhos que não apenas situar-se obviamente contra o mandatário em questão, mas em aplicar a arte como salvação em tempo de reclusão, em que nunca foi tão pejorativo ser artista. As vozes pelas quais se levanta em Diário dentro da Noite, com suas camadas de gênero (sim, o diretor possibilita até olhar para uma breve história de fantasmas, ao menos no imagético), são as vozes pelas quais todo homem na posição de Diaz ampliou seu lugar.

Um grande momento
“Lula já está solto, e nós estamos presos”

[25ª Mostra de Cinema de Tiradentes]

Curte as coberturas do Cenas? Apoie o site!

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
Assinar
Notificar
guest

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

0 Comentários
Inline Feedbacks
Ver comentário
Botão Voltar ao topo