(Marriage Story, EUA, 2019)
Peço licença ao leitor para ser um pouco mais pessoal em um texto que fala sobre algo que é sempre tão pessoal como a separação de um casal. Do alto dos meus quatro casamentos acabados, acho que nem conseguiria fazer diferente disso.
Para começar, há algo que me incomoda em História de um Casamento assim como em qualquer outro filme da mesma temática. Vários já foram feitos, mas sempre é a perspectiva do homem que prevalece. Noah Baumbach (Frances Ha) até tenta fazer algo equilibrado, mas não tem jeito, a balança pende sempre para o lado masculino da relação no final das contas, pois, mais uma vez, é um homem que esta contando a história e isso faz, sim, toda diferença.
Porém, assim como os outros, ainda que seja tendencioso e tendo o tema repetido (só o tema geral porque histórias de amor e suas rupturas vão ser sempre diferentes, mesmo que uma das pessoas envolvidas se repitam), História de um Casamento tem o seu valor.
Ele começa com duas declarações de amor. Conhecemos Nicole e Charlie pelos olhos do outro. Há doçura no momento, paixão, até que a ruptura se estabelece. O jogo cênico remonta a muitos outros já vistos no cinema. Aliás, o filme de Baumbach bebe de muitas fontes, passando por Allen, Bergman, Reiner, Benton e outros. A construção, clássica, é mais uma dentre aquelas que representam um dos sentimentos mais vezes catalogados da espécie humana.
Aquilo que se vê na tela, e também o que não se vê, é facilmente identificado e isso traz uma grande força ao filme. Diferente do que pensa, Baumbach direciona o olhar para uma interpretação favorável ao seu ponto de vista. Aquela é a história de um homem quebrado. Porém, ainda que Adam Driver (Paterson), em uma atuação incrível, tenha mais tempo de tela, Scarlett Johansson (Sob a Pele) vai tão fundo na dor de sua Nicole que é possível perceber a tentativa de uma duplicidade na narrativa. Portanto, mesmo que o “filme de casal” não se concretize no resultado final, mesmo que a duplicidade não seja completamente efetiva, há um resquício desta identificação.
E como é duro passar por esse momento. Dói perceber que as coisas vão mudar completamente dali para frente, dói o sentimento de fracasso que acompanha qualquer separação, dói ter que se adaptar a uma nova vida. O filme consegue alcançar muito bem esses lugares da dor, chegando principalmente nos pontos mais marcantes da ruptura, como, por exemplo, na vilanização da relação e da outra pessoa. Passos difíceis, mas importantes para que se siga caminhando.
Para não ser tão dolorido, ainda que seja bastante, o diretor pontua o filme traz o humor para a história. Com um elenco extraordinário, que conta com nomes como Laura Dern, Alan Alda (Crimes e Pecados), Merritt Wever (Birdman) , Ray Liotta (Os Bons Companheiros) e Julie Hagerty (Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu), ele suaviza a tristeza, embora os momentos mais catárticos aconteçam justamente com alguns deles.
História de um Casamento é um filme muito bem acabado, extremamente pessoal e, justamente por isso, tem grande possibilidade de falar alto ao público que o assiste, que conseguirá ver na tela muito daquilo que já viu fora dela. O longa é uma produção da Netflix e estreia na plataforma no começo de dezembro.
Um Grande Momento:
A conversa com Bert.
[43ª Mostra de São Paulo]