Crítica | Cinema

Meu Pai é um Perigo

Cabo de guerra

(About my Father, EUA, 2023)
Nota  
  • Gênero: Comédia
  • Direção: Laura Terruso
  • Roteiro: Austen Earl, Sebastian Maniscalco
  • Elenco: Robert DeNiro, Sebastian Maniscalco, Leslie Bibb, Kim Cattrall, David Rasche, Anders Holm, Brett Dier
  • Duração: 85 minutos

Sebastian Maniscalco. Para quem não é do universo da comédia ‘stand-up’, pronunciá-lo não significará muita coisa, mas a partir da estreia de Meu Pai é um Perigo, tendo a crer que isso irá mudar. No imdb, o currículo de Maniscalco é surpreendente, ele esteve nos premiados Green Book e O Irlandês, mas confesso que não lembro do seu rosto, mas era fácil de sacá-lo ali entre mafiosos e carcamanos. Provavelmente por conta do segundo, conseguiu convencer Robert DeNiro a co-protagonizar sua estreia como roteirista junto a ele. E fiz esse ‘pavoneamento’ prévio para não assustar o leitor com o que parece muito óbvio em relação às escolhas do ator de Touro Indomável recentes para a comédia – e não, esse aqui não é muito diferente de títulos como Tirando o Atraso e Em Guerra com o Vovô.

Não duvido que Maniscalco tenha talento nos palcos, ou que não tenha correspondido muito bem nos filmes de Martin Scorsese e Peter Farrelly, mas ao mesmo tempo, imagino que ele tenha sido aquele cara que cresceu ouvindo que era “muito engraçado”, de todos os amigos e de que a história de sua família daria um filme hilário. Pois bem, ele foi fazê-lo, e ele se coloca como alter ego nesse Meu Pai é um Perigo, que deve ser para ele o que Minha Mãe é uma Peça devia ser para Paulo Gustavo – uma radiografia sobre a própria vida, com tons berrantes e algumas licenças poéticas dos autores. Também imagino que tanto para ele quanto para seus amigos o resultado tenha saído muito divertido, correspondendo às expectativas de quem sempre o acompanhou. Para o resto do público, o resultado não causa a mesma impressão. 

Uma comédia, acima de tudo, precisa causar o que pretende. Não estou dizendo que, automaticamente, as pessoas devam sair rolando das escadas de tanto rir, até porque um espectador não deve equiparar suas reações a de outro. E mesmo sabendo o quanto a relação com a comédia varia de pessoa para pessoa, algum termômetro deveria ser acionado a partir do que é produzido, que levasse ao menos nossa simpatia. Meu Pai é um Perigo não provoca nada, na grande parte do tempo – nem sorrisos, nem empatia, nem compreensão, nem cumplicidade. Nada. Ah sim, algumas vezes provoca raiva, justamente por não nos levar a sentir coisas alguma, mas tirando isso, é uma sessão vazia de sensações, mas que não nos deixa de proporcionar alguma reflexão, ainda que diante da ausência. 

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Meu Pai É um Perigo
Dan Anderson/Lionsgate

Na direção, Laura Terruso, que entregou anteriormente Dançarina Imperfeita com igual impacto e boa vontade de sua parte. São filmes onde provavelmente ela foi contratada para marcar as cenas e pouco além, já que a presença de uma autoria inexiste. O autor aqui é Maniscalco, que elabora o que quer com a narrativa que construiu, onde a jovem diretora é apenas uma funcionária dele e dos irmãos Weitz, que produzem. Existe uma tentativa ininterrupta de ser engraçado, o filme acredita que está conseguindo realizar essa façanha no público, mas não basta querer se você não tem potencial de chegada, e muito disso se vale pelo conjunto que vai da direção até o roteiro, passando pelo timing (que não existe) e por essa figura centralizadora, que é o roteirista/protagonista/autor.

No entanto, paralelo à isso, rapidamente percebemos duas forças motrizes em Meu Pai é um Perigo, e elas advém de seus intérpretes, em um embate inexplicável. De um lado, temos um DeNiro que de verdade não está no piloto automático que acomete a ele quando confrontado por projetos muito ruins, e que ele aceitou sabe-se lá porquê. Aqui, o espectador pode perceber que o vencedor de dois Oscars acredita no que está fazendo, e se entrega de verdade a algo que não faz jus à sequer parte ínfima de seu talento. Do outro lado da corda, Maniscalco a todo momento tenta sabotar o próprio projeto… ou não, né… quem em sã consciência faria de tudo para estragar um trabalho tão especial pra si? Ok, então alheio à sua vontade, o filme corre ladeira abaixo porque seu mentor nunca vai além do muito ruim em cena, e na maior parte das vezes constrange com sua falta de maturidade, apatia e deslocamento. 

Agora vejam só, por causa do idealizador do projeto, Meu Pai é um Perigo se estagna no que de pior uma comédia poderia oferecer: ao invés do humor, o constrangimento pela falta. Todo o resto é arrastado para essa espiral vergonhosa que faz de tudo para nos tirar da inércia, em vão. Não há sinal mínimo de inteligência, e charme, que reorganize suas intenções para alcançar algum objetivo. Nem todo mundo tem o que transbordava em Paulo Gustavo, essa é a moral da história.

Um grande momento

Salvo perdoa seu filho – e a culpa do ‘grande momento’ é exclusiva de DeNiro

Francisco Carbone

Jornalista, crítico de cinema por acaso, amante da sala escura por opção; um cara que não consegue se decidir entre Limite e "Os Saltimbancos Trapalhões", entre Sharon Stone e Marisa Paredes... porque escolheu o Cinema.
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